Vinha
eu do Mercado Central, onde fui comprar um legítimo queijo do Serro na
cachaçaria do “Ronaldo dos Queijos”, quando, sentado nos bancos da turma da
“melhor idade”, não pude deixar de ouvir o animado bate-papo entre o motorista
e o trocador do coletivo “Sion-Cidade Nova”.
O
motorista, claro dos olhos azuis, dos seus 35 anos, falava ao celular com moça
conhecida, enquanto aguardava abrir o sinal de trânsito na Rua Espírito Santo
com Avenida Afonso Pena:-
“-
Sabe, filha, não dá pra falar muito agora, estou no trânsito. O sinal vai abrir
já. Dá pra você me ligar dentro duma meia-hora? Aí, no final da linha, falaremos
mais à vontade.”
“-
Eita, “Doidão”, tá de conversa mole com a tal gatinha, né? Vê se te manca,
cara! Tú tá dirigindo, meu irmão!...”
“-
Fica na sua, cobrador! A menina tá me dando mole, só tem 26 aninhos, saca? Tou
só administrando, por enquanto.”
O
sinal abriu, o ônibus arrancou e os dois prosseguiram numa prosa bem animada,
falando sobre diversos assuntos, desde mulheres, passando pelo futebol (eles
torciam pelo “Galo” e pela queda da “Raposa” para a Segunda Divisão do
Brasileiro) até a política e a corrupção desenfreada em Brasília, como de resto
em todo o país.
Daí
a pouco um motoqueiro fez uma manobra arriscada à frente do “busão”, o
motorista meteu o pé no breque, xingou o maluco da motoca e disse ao cobrador:-
“-
Cara, quer saber? Tou pensando seriamente em deixar de ser motorista, levantar
meu “Fundo de Garantia” e abrir um negócio próprio, tá ligado?”
“-
Que tipo de negócio, “Doidão”? Tú tem experiência de alguma coisa, já mexeu com
comércio na vida?”
“-
Velho, tive analisando, do jeito que esses motoqueiros andam no trânsito, no
Brasil inteiro, esse é um negócio muito promissor:- vou montar uma empresa pra vender
caixões e coroas de flores, próxima ao Cemitério do Bonfim! Vou ganhar muito
dinheiro, prezado! O que tem de nego morrendo todo dia por aí é um caso sério!
...”
“-
Tá aí, “Doidão”, um negócio bem bolado. Me leva junto? Vou ser divulgador,
relações públicas e vou te ajudar no negócio. Manda fazer uns cartões, vou
distribuir nos velórios da “Santa Casa”,
vou arranjar “fregueses” pro teu comércio. Também quero sair dessa bosta
de serviço e ganhar dinheiro, me aprumar na vida! ...”
O
ônibus rodava pela Cristiano Machado, trânsito intenso àquela hora da manhã,
quando deu uma brecada violenta diante do semáforo que fechou de repente.
Ouviu-se um estrondo na sua traseira, gritos dos passageiros e dos transeuntes,
motorista e cobrador desceram e viram estendido no asfalto, bem atrás do
“busão”, um motoqueiro todo quebrado, moto espatifada debaixo do pesado
veículo, capacete à distância e o sangue escorrendo da sua cabeça partida,
talvez o primeiro “freguês”disposto a inaugurar a funerária do motorista
“Doidão”!...
Um comentário:
Que crônica interessante! Veja, tão cotidiana que encanta! Parabéns ao autor pelo delicioso texto.
Abraços sempre afetuosos.
Fábio.
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