segunda-feira, 5 de março de 2012

Pode me chamar de medroso. Mas que elas são perigosas, isso elas são - Autor: Marcio Jr


Não negue. Você tem medo de algo. Pode ser de assalto, de altura, do boi da cara-preta, de gato preto, ariranha, pinguim azul, borboleta de quatro olhos... sei lá. Sempre tem alguma coisinha, lá no fundo, que deixa a pessoa, no mínimo, receosa.

Um fato estranho aconteceu no dia de ontem (30 de janeiro de 2012), e que por pouco não me leva para a delegacia. Dos males, o menor. Apenas quebrei um dente. Resultado de tudo, e para variar, paguei o maior mico.

Faz algum tempo, brinquei com uma pessoa de minha estima que morro de medo de... velhinhas. É. Senhoras inocentes, daquelas que passeiam por aí com seus amados guarda-chuvas pretos e longos, que estão sempre prontos pra acertar nossas cabeças caso elas pensem que estão sendo assediadas (não existe somente assédio sexual, seu mente poluída).

Desde minha infância, convivi com senhoras idosas que, de boas almas e caridosas, não tinham nada. Educação mais austera, tias muito mais velhas do que minha mãe, e a maioria delas adoravam dar uns beliscões nos sobrinhos quando eles aprontavam. E eu aprontava muito. Com o passar do tempo, uma professora de matemática invocou comigo e com todo o restante da turma. Era uma ranheta, que usava um cabelo grisalho e vivia dando cascudos em nós. A matéria? Matemática. Ela falava que era para tirar a “serragem” da cabeça dos alunos. Doía demais.

Mais um pouco de tempo e noivei (oh! trem; não noivei com a professora de matemática não). Nessa época, conheci uma senhora muito pequenina e de cabelos alvos, que morava próxima à casa de minha noiva. Risonha, a diversão dela era matar gatos e jogar nas pessoas. Santa velhinha. Certa vez, eu passando perto da casa dela, cai em minha cabeça um gato morto. Eu, ainda sonolento, quase morri do coração, e desci o verbo. Além de ter que aguentar a cena do gato, ainda tive que escutar outro tanto de um cidadão desavisado, que achou estar eu ofendendo aquela “bondosa” senhora. Na semana seguinte era ele xingando a dita.

Passou mais um pouco, me separei, abri uma empresa e, ao lado da minha loja, uma linda e miudinha senhora de seus 70 anos (elas sempre são miudinhas, não é?). Adorava conversar com ela. Ria descabidamente, e o namorado dela, um senhor de seus sessenta e tantos anos, parecia andar nas nuvens. Certo dia, tristeza. O coitado do namorado morrera naquela manhã. No caixão, ele mostrava um sorriso enorme. Alguns dias depois, fiquei sabendo que aquele não era o primeiro distinto defunto daquele doce senhora. Era o quinto que morria, e nas mesmas condições. Uma semana depois, quando me dou conta, era o avô de um amigo que “conversava” alegremente com esta senhora. O velório dele foi no mês passado.

Sei que, no fim das contas, meu pior pesadelo é com a vovó do Piu-piu. Aquela mesma que vive “guardachuvando” a cabeça do Frajola. Já caí da cama ao sonhar com ela, e o pior, ela sempre me persegue. Se eu corro, ela vem de patins, se eu pego uma bicicleta, ela vem de moto. Um inferno, ou melhor, um pesadelo atrás do outro.

Resumindo, e respondendo a pergunta de todos. O que meu medo de velhinhas tem com meu dente quebrado e o fato de eu quase parar numa delegacia?

Como todo mundo, preciso ir ao banco para pagar minhas contas. Aquelas portas giratórias sempre, mas sempre mesmo, se invocam comigo e travam. Mas passei. Fui até minha gerente e estava eu lá, conversando, até que olho para a porta giratória e vejo o vigilante “liberar” a porta para uma inocente senhorinha de cabelos grisalhos (pequenina, para variar) e seu enorme e assustador guarda-chuvas. Do nada, dispara um desgraçado dum alarme...

...o reboliço foi geral. Minha gerente conseguiu, em dois segundos, se enfiar debaixo da mesa, e ligou para a polícia (nem precisava, pois o alarme dispara diretamente na delegacia). A balburdia continuava, e ninguém se entendia. A única pessoa a ficar em pé foi a velhinha, que carregava o guarda-chuva como se fosse uma espingarda.

Não me aguentei e pensei: “ela tá assaltando, e tá de costas; vou passar uma rasteira nela”. Mas não deu tempo. O alarme parou de soar, e dos males o menor, era só uma falha no sistema. Foi só o susto.

Só não deu tempo para refrear minha boca. Quando desligaram o alarme, estava eu lá, acusando aquela senhora de tentar assaltar o banco. Eu estava cego de “sei lá o quê”, e falando pelos cotovelos. Saí completamente do meu estado normal de lucidez. Piorou ainda mais quando o vigia tentou me conter.

--Essa mulher é um perigo. --falei, assustado.

Nem bem terminei de falar e a senhora, quase surda ao que tudo indicava, pois não entendeu patavinas do que eu falei, se virou para o lado, e a ponta do guarda-chuva pegou diretamente em minha boca. Detalhe, a boca estava aberta, e o dente quebrado voou para dentro... do meu estômago.

Resultado de tudo. Perdi um dente, queriam me acusar de agressão verbal a um idoso, e minha dentista, tirando o maior sarro da minha cara, ainda fala a seguinte pérola:

--Me traz o dente que eu colo ele.

Engraçadinha ela, não é?


Autor: Marcio JR - Curitiba/PR

Publicação autorizada através do e-mail de 22/02/2012

É claro que tudo o que foi descrito acima não passa de brincadeira, com exceção de eu ter quebrado, realmente, um dente. E tudo se deu num descuido caseiro, num instante de pura desatenção e uma porta de geladeira esquecida aberta. Até acho que a geladeira me agrediu, a bem da verdade. Mas nem tente imaginar a cena comigo batendo contra a geladeira e caindo de boca aberta sobre as costas de uma cadeira. Foi hilária para quem assistiu e muito, mas muito dolorida para mim.

Que me desculpem a enormidade de senhoras idosas que conheço, e são muitas, muitas mesmo. Adoro todas, se bem que, depois dessa crônica, elas vão me odiar. Mas tudo bem, desde que a dona Maria, aquela viúva por seis vezes não venha me perseguir... eu eu não conseguiria passar esse episódio do dente quebrado sem alguma risada. Perdão a todas.

Abraço a todos.

PS.: meu livro já está a venda, mas somente na livraria virtual.
livro ABISMO DAS VAIDADES - Coletânea de Crônicas

7 comentários:

Patrícia Lopes - Custódia PE disse...

Adorei! E é verdade, são danadinhas, rsrsrsrs. Lamento pelo seu dente Marcio Jr.

Marcio JR disse...

Olá, Carlos.

Antes de qualquer coisa, gostaria de agradecer ao convite para publicar meus contos aqui. Como te falei em e-mail, me senti até um tanto amedrontado, pois o rol de autores que publicam aqui são excelentes, e eu sou um mero iniciante na arte. Conheço a maioria deles, e aqueles que ainda não conheço, vou me inteirando aqui pelo blog. Mas são também de uma qualidade e criatividade a qualquer prova.

Quero agradecer também, antecipadamente, a todos aqueles que lerem meu conto. Comentando ou não, sei que a apreciação crítica daquele que ler é um direcionador inestimável para todo aquele que escreve. E, claro, agradecer a Patricia Lopes, que me recebeu com seu caloroso comentário.

Obrigado a todos.

Marcio

Carlos Lopes disse...

Marcio, você tem toda razão. O time de autores do blog é excelente ... e cada vez chegando mais (como é o seu caso. Em nome de todos, seja bem vindo amigo.

Denis Bonifácio de Souza disse...

Lamento pelo seu dente. Dizem que ao envelhecer a gente perde em tamanho ... será verdade? Muito interessante sua abordagem mesmo que seja somente de brincadeira.

Celêdian Assis disse...

Márcio, meu amigo querido!

Fiquei muito feliz de vê-lo também aqui neste espaço tão simpático criado pelo também amigo Carlos Lopes. O time que se junta aqui, só tem a ganhar com sua presença, um escritor talentoso, de muita sensibilidade, de um humor fino e uma figura humana fantástica. Tenho imenso orgulho de tê-lo em meu rol de amigos.

Sobre o texto, já o havia comentado em seu blog e após o susto pelo dente quebrado, só pude rir muito da sua "velhafobia" (neologismo criado para este contexto)...srrs. Enfim, uma excelente e prazerosa leitura.
Um grande abraço, Márcio e saiba que desejo muito sucesso como o seu maravilhoso livro "Abismo das vaidades".
Celêdian

Anônimo disse...

Boa noite Marcio Jr, seu conto está ótimo!Envolve o leitor, do início ao final, parabéns!Abraços, Vanice Ferreira (Curitba-PR).

Ana Bailune disse...

Ainda bem que no final você explicou que era só brincadeira! MAs... e a velhinha que matava gatos? Era verdade mesmo? Muito divertida a sua crônica!