Autor: Charles Lucevan Rodrigues
Criara
uma espécie de ritual matinal. Via a pessoa pelos pés e ia subindo a porta
devagar tentando imaginar quem era, se conhecia, se poderia ser bonita, feia,
bem ou mal trajada... Tentava imaginar se pelas pernas era possível determinar
se o que havia da cintura pra cima correspondia ao que havia dali para
baixo...Naquela manhã, no entanto, algo diferente se fez sentir em sua espinha
dorsal, e não era causado pelo frio, era algo, diferente. Ficou parado no tempo
admirando aquele par de pernas...
—Ei!
Abre logo! Está frio aqui fora!
A
voz era de alguém que não conhecia. Buscou na mente o timbre daquela voz e
resolveu que decididamente, não conhecia aquela pessoa, parada há apenas um
metro de si. Tão perto e tão intrigante... Teve um ímpeto de espiar por baixo
da porta e resolver logo a questão, e por pouco isso aconteceu, mas, num átimo,
se segurou e deu uma pausa contemplativa para o par de pernas reclamando do ar
frio daquela manhã.
—Espe...
pe... pera! Tra... travou aqui! Mentiu pra justificar a sua pausa!
—A
voz ou a porta? Perguntou ela em tom brincalhão.
—Quê?
—Brincadeira!
É que você gaguejou e eu fiz uma brincadeira sem maldade. Desculpa tá?
—Tem
nada não! (Seu par de pernas por sua vez se fez ouvir lá de dentro).
Levantou
a porta um pouco mais e de forma mais lenta que a habitual e se encantou com a
visão à sua frente. O mais bonito par de olhos que se cruzaram com os seus
próprios estava bem ali à sua frente. Enormes, brilhantes e chamativos...
Pareceu-lhe perceber que ela já sabia desde sempre que os seus olhos encantavam
a todos, mas, no entanto, ele devia estar parecendo àquela completa estranha um
completo imbecil ali, bloqueando o caminho da cliente. Ele, de fato, estava
bloqueando o caminho da jovem, mas esta não estava simplesmente esperando que
ele saísse da frente para ela poder entrar. Na realidade, por ela, ele poderia
demorar o tempo que fosse. A única coisa mais sensata e completamente impensada
que ele conseguiu dizer foi:
—Bom
dia! Veio comprar pão? (não, imbecil, ela veio na padaria às cinco da manhã pra
comprar carne)... Refletiu, pensando no quão idiota isso lhe fez parecer...
—
Bom dia! — Não, vim comprar carne... (e riu uma risada solidária se fazendo
amistosa e simpática para quebrar o gelo).
—Ah
tá! (rindo). Você lê pensamento?
—Eeeuuu?
Porque?
—
Nada não! (Graças a Deus!)
—Nunca
te vi por aqui.
—Acabei
de me mudar pra cá! (Que bom!)
—Que
ótimo! Então, seja muito bem vinda a minha mais nova freguesa. Pode até não ser
a melhor padaria da cidade, mas com certeza é uma padaria premiada!
—Premiada?
—
Sim, premiada! Acabamos de ser premiados com a presença da cliente mais
simpática e madrugadeira do bairro.
—Ahhh!
Quer dizer agora que sou um prêmio?
—No
mínimo um regalo! Com todo o respeito, abrir a porta hoje e ser encarado por
tão belo par de olhos... Sim, um regalo!
Ruborizada,
refletiu, antes de adentrar o recinto, se aquela ousadia do sujeito à sua
frente lhe incomodava por se tratar de – não tinha decidido ainda se era ou não
um assédio repulsivo - ou se pelo fato de estar gostando daquela conversa. Não
era uma cantada desrespeitosa, não era vulgar, (meus olhos são realmente
bonitos), mas, ser tão bem tratada e elogiada às cinco da manhã por um completo
estranho lhe fez sentir aumentar o próprio ego. Ele não tinha nenhum atrativo
físico que se destacasse. Era uma pessoa comum, mas sua simpatia não era
forçada para lhe encantar.
Parecia
ser natural do seu ser. Ficou encantada por essa simpatia, pelo seu bom humor e
principalmente, pela verdade no encantamento explícito no olhar dele cada vez
que ela comparecia no seu estabelecimento fosse pra comprar pão, seja por
qualquer desculpa para vê-lo. Era como se fosse sempre a primeira vez que a via
e a admirava sempre com a mesma verdade. Ela amava sentir-se admirada da forma
tão verdadeira como via claramente nos olhos e atitude dele. Não que já não
houvesse sido admirada por homens antes, sim, muitas vezes, mas todos com
desejos carnais cujas intenções bestiais eram-lhe tão palpáveis que escapavam
do recôndito das mentes de tais seres ignominiosos e, para ela, era como se
estivesse vendo um filme onde toda a sua nudez, intimidade, privacidade e
vontade eram plenamente violentados de tantas formas que ela não sabia ser
capaz de imaginar. Com ele era diferente. Não lhe via maldade no olhar e nas
atitudes.
Apenas
admiração, contentamento com a sua simples presença. Era como se ela mesma
fosse uma obra de arte a ser admirada mas não tocada. Passou a frequentar a
padaria sempre no mesmo horário, procurando ser sempre a primeira cliente do
dia, pois, nesse horário, poderiam ter um tempo maior a sós, pois a maioria dos
clientes só chegava mais tarde. Com o tempo, percebeu que a porta não travava
sempre no mesmo lugar, pois, sem querer, pode perceber no reflexo do vidro da
vitrine de bolos atrás dele que ele estava curtindo olhar para ela aos poucos,
como se estivesse desenrolando um presente ao mesmo tempo que “enrolava” a
porta levadiça... Com isso, sem se denunciar, passou a cada dia, usar uma peça
de roupa que realçava suas pernas, um short, uma saia, um vestido que encobria
tudo, para que cada dia pudesse testar a capacidade dele de saber se era ela ou
outra pessoa que ali estivesse esperando o estabelecimento abrir as portas.
Um
dia, por pura artimanha, calçou os sapatos, calças e camisa do seu pai e se divertiu
muito ao perceber pelo reflexo da vitrine atrás dele, o choque momentâneo que
ele tomou ao “perceber” que naquela manhã o seu primeiro cliente era um homem
e, nesse dia, incrivelmente, a porta não travou. Se divertiu ao ponto de não
conter uma gargalhada. Ver o olhar dele ao se deparar com um homem cujos olhos
eram tão bonitos e chamativos quanto os dela... Ele ficou estupidificado
enquanto ela precisou se sentar em um dos bancos à beira do balcão onde apoiou
o rosto sobre a bancada, rindo ao ponto de perder o fôlego e se engasgar,
precisando beber um pouco d'água para se recompor.
—Porque
isso?
—Isso
o quê? (como se eu não soubesse...).
—Vestir-se
de homem, sapatos, camisa... ?
—Queria
comprovar uma teoria, e o fiz. Precisava ver a sua cara!
—Teoria?
—Sim,
ou seja, a de que você gosta de me observar aos poucos. Imaginou que fosse eu,
ficou frustrado ao imaginar que não era e depois, abobalhado ao perceber que
era. Observei sua reação pelo seu reflexo na vitrine. A porta hoje não emperrou,
não é mesmo? E se engasgou de novo de tanto rir.
No
começo ele ficou irritado por seu artifício ter sido descoberto, mas depois,
reconheceu os atributos da inteligência e do bom humor dela. Amou-a ainda mais.
Ainda mais platonicamente. Mas, era-lhe valiosa demais para se declarar.
Correria o risco de afastá-la dali de uma vez por todas caso não fosse
correspondido. (Mas tenho tanta certeza de que ela também sente o mesmo por
mim!... Mas e daí, você vai arriscar perder tudo, esse olhar, esse sorriso, essa
alegria, esse bom humor, logo agora que essa amizade está claramente
consolidada?)
Sua
mente ficava sempre brigando no íntimo dos seus miolos, lutando para se decidir
entre a certeza de uma boa amizade e a possibilidade de um amor perdido.
Decidia sempre por “se declarar um dia...”
— Um
dia...!
Tudo
isso, até então, aconteceu em dezembro... depois, as férias escolares
terminaram e vieram as aulas. Com elas, para as suas respectivas felicidades
plenas, descobriram-se colegas em uma mesma classe. Se riram como bobos, se
abraçaram, decidiram sentar-se lado-a-lado, viraram confidentes um do outro,
(menos do que sentiam verdadeiramente entre si), - essa informação era preciosa
demais para se arriscar por tudo a perder. Confabularam estratégias para passarem
de ano nas provas e sempre davam certo, já que estudavam juntos. Ele, era bom
em português, ponto fraco dela, ela em matemática, o terror da vida dele. Foram
assim, sendo colegas, amigos e companheiros até o segundo ano do segundo
grau... quando se deu o inesperado: A mãe da sua amada contraiu doença grave e
precisava se mudar para uma cidade maior que oferecesse melhores recursos nos
tratamentos indispensáveis que a sua cidade não poderia lhe oferecer.
A
mudança de cidade e de escola foram rápidas e necessárias demais para que
pudessem se despedir e se preparar para a mudança deveras trágica para ambos.
Por uma ou várias circunstâncias da vida, perderam todos os contatos. Ela se
envolvera demais nos cuidados com a mãe. Estava infeliz e depressiva demais
para escrever para o seu... amigo?... amado? Um dia! Quando puder, um dia! Ele,
por sua vez, voltou a ficar sonolento, triste. Perdeu o interesse até em
cumprir seu ritual na porta do estabelecimento. E, assim, muitos anos se
passaram sem que pudesse ter quaisquer notícias da amada. Porque nunca se
declarara? Se pudesse ter só mais uma chance, só mais uma... Permaneceram
assim, muitos anos seguidos e, por fim, aprenderam a arquivar seus respectivos
sentimentos em algum lugar dentro de si. Agora, sabiam-no, tardiamente, com
todas as certezas possíveis: Era amor o que sentiam...!
Descobriram
tarde demais: era amor o que sentiam... Além da falta inominável, amor.
Conheceu
no período noturno da escola uma outra garota. Era bonita. Conversavam o
trivial, nunca se olharam com outros olhos senão o de respeito. Nem amigos
podiam se dizer, pois não tinham qualquer outro contato senão nos momentos de
realizarem as atividades escolares. Da escola pra fora, cada um pro seu canto e
nada mais.
Nas
peças que a vida costuma pregar nas pessoas, como que para propositadamente
abalá-las, eis que um, sem saber do outro, se afastaram da cidade em direção a
um sítio onde estava acontecendo uma festa junina... Ambos estavam enfastiados,
sós, depressivos e sem ter mais o que fazer. Foram! Lá, viram que não conheciam
ninguém. A festa estava boa, animada, mas não conheciam ninguém. Estavam sós na
multidão, em lados opostos do terreiro da casa onde todos dançavam.
Perambulando ainda mais decepcionados, eis que os colegas praticamente se
trombaram ao desviarem de um casal empolgado no salão. Ficaram cara a cara! O
sorriso veio de forma rápida e espontânea. Enfim, alguém que eu conheço! A
conversa entre os dois iniciou-se tão rápida quanto a dança na qual se
envolveram quase que mecanicamente.
Dançaram
a noite inteira e o tédio por fim foi vencido quando se engalfinharam entre
beijos e abraços no aperto da cabine do carro dele. No dia seguinte, deixaram
ambos de ir na escola sentindo-se envergonhados reciprocamente. Mas teriam que
se encarar novamente, mais cedo ou mais tarde. O pior é que ambos ficaram
realmente mexidos com o que tinha acontecido na noite anterior. Os dois estavam
mesmo era com medo um do outro no dia seguinte, dizer claramente que aquilo
nunca mais iria se repetir. Pois, a bem da verdade, queriam que aquilo se
repetisse mesmo pelo resto de suas vidas. Uma semana inteira evitando a
conversa inevitável. Uma semana inteira se olhando de longe e quando um
percebia que tinha sido notado, baixava os olhos tarde demais e o outro como
que por reflexo também desviava o olhar. Aquilo só fez lhes aumentarem os
desejos.
Ela
tomou a iniciativa de lhe enviar uma amiga para lhe perguntar se ele aceitava
conversar com ela. Se aceitasse, o assunto estaria resolvido, se não, seria poupada
do que lhe seria uma vergonha e decepção por ter sido tão tola por acreditar
que aquilo tinha significado algo pra ele... Aceitaram, conversaram, se
engalfinharam. Tudo novamente e de forma mais calorosa que no aperto do carro.
Engataram namoro sério. Quando o namoro fica sério é natural quererem
apresentar mutuamente as suas respectivas famílias e amigos. Quando o namoro
fica sério, não há o que temer, o que esconder. Foi o que quiseram. Pais, mães,
irmãos, almoço ou jantar na casa das respectivos famílias. Sair e apresentar os
amigos foi o próximo passo. E foi nesse passo que tudo descompassou!
Há
vários dias sua já namorada vinha lhe falando com muita empolgação da grande
amiga dela. Que lhe era como irmã. Que era sua vizinha. Que era sua confidente.
Que ele precisava conhecê-la. Que ele iria amar a amiga dela que era nas
palavras da sua amada “a pessoa mais incrível do mundo”. Sucedeu que era mesmo!
Marcaram de ir a um churrasco na casa da amiga. E foram! Ele, todo curioso.
Ela, eufórica! Pela euforia dela ele media que a amizade entre elas era
realmente importante. Chegaram de braços dados e sorridentes no endereço
marcado... A namorada pediu-lhe em tom solene que esperasse sentado no sofá da
sala enquanto ela ia lá nos fundos trazer a amiga para fazer as devidas
apresentações. Ele não conhecia ninguém da casa e, pouco à vontade, sentou
assim mesmo no sofá. Sua namorada saiu correndo e saltitante e sumiu no meio
das pessoas que já haviam chegado antes e já estavam enturmadas comendo e
bebendo em conversas animadas.
Estava
observando os presentes tentando reconhecer alguém quando, por sobre o som
ambiente começou ouvir risadas alegres das duas mulheres que vinham em sua
direção empurrando educadamente os presentes na sala, de modo que a sua namorada
vinha por trás da outra, fechando-lhe os olhos com ambas as mãos querendo-lhe
fazer surpresa no que se referia à figura do seu amado. Queria que a amiga
sentisse a sua alegria e, por certa maldade interior, queria que ela sentisse
uma pontinha de inveja pelo fato de ela ter conseguido um namorado e a outra
não.
—Calma,
calma... deixa eu acabar de comer esse palito de tira gostos... (popularmente
chamado de “sacanagem”, comumente servidos nas festas familiares na década de
80).
—Que
isso? Come depois! Vai ter a festa toda pra comer. Agora quero lhe apresentar
meu namorado! E foi andando, empurrando a amiga em direção ao sofá da sala.
Nessa altura, a situação já havia chamado a atenção dos presentes e todos
ficaram curiosos, olhando na direção delas.
— Está
preparada?
—Tô
com a boca cheia! Ai que vergonha! Nem me deixou acabar de comer direito...
Sua
amiga não teve tempo de se desvencilhar do palito onde estavam espetados
azeitonas, pedaços de queijo, de presunto e salaminho que tinha acabado de tirar
de uma bandeja pra comer, quando a amiga de sopetão lhe tapou os olhos e saiu
lhe arrastando pelo salão. Não conseguia comer porque não conseguia tirar o
palito enquanto suas mãos estavam ocupadas em se equilibrar no meio dos
presentes sobre os quais era empurrada com certa veemência ante a empolgação
daquela que lhe conduzia. Só conseguia dizer a todos de boca cheia e de forma
ininteligível e aos tropeços:
—Desxulpa!
Dischulpa!
Pararam!
Ele se levantou e ficou a poucos centímetros das duas à sua frente. Um sorriso
que ressaltava curiosidade e um certo constrangimento, pois naquela altura dos
acontecimentos, eram sem dúvida o centro das atenções.
—Está
preparada?
—
Anda logo! Meus olhos já estão doendo. Acaba logo com esse suspense!
Sua
namorada então, lentamente foi puxando pra cima e de forma simultânea, as
palmas das mãos estendidas sobre os olhos da outra. Como que num clique, a
mente dele voltou nos tempos da padaria, vendo a porta levantar aos poucos para
descobrir a pessoa por trás dela. O momento passava como que em câmera lenta e
pôde por fim ver os olhos dela. Os olhos dela...
Seu
coração doeu como que se estivesse sendo dilacerado por dentes. Suas vistas
escureceram e precisou sentar novamente no sofá da sala para não cair. Ela, por
sua vez, em virtude do grande susto, tentou suspirar e aquilo foi tão violento
que aspirou para dentro de suas vias aéreas o tira gosto formado pelas
azeitonas, os presuntos, o queijo, o salame e... o palito que unia tudo isso.
Aquilo foi como ter preso na garganta um anzol que espetava por ambas as
pontas.
Era
grande demais para seguir em frente e preso demais para voltar por onde havia
entrado. As lágrimas já saltavam aos belos e inesquecíveis olhos à sua frente,
olhos agora rubros pelo sangue preso em seus vasos. No começo, ele entendeu que
as lágrimas dela eram em virtude da emoção que ela estava sentindo ao revê-lo.
Pudera, ele também estava à beira do choro! Ela lhe estendeu os braços para
nele se firmar e ele, agradecido, abraçou-a com firmeza para matar a saudade
que dela sentia. Ela começou a soluçar e ele libertou também o seu soluço que
até então tentou prender no peito.
Sua
namorada, com a visão bloqueada pelo corpo da amiga à sua frente não entendia
aquele silêncio:
—Não
vão dizer nada? Falou, rindo por entre os dentes pela ansiedade da expectativa.
— Esse é o meu namorado! — O que achou? Sua amiga tirou as mãos de sobre o
ombro do rapaz à sua frente e as levou ao próprio pescoço tentando em vão se
livrar do que lhe incomodava por dentro. Sua boca estava totalmente aberta em
busca de ar. Suas unhas involuntárias e afiadas começaram a estraçalhar sua
pele sensível causando verdadeiro estrago, como estiletes insaciáveis e
implacáveis. Só então os presentes começaram a se dar conta da gravidade da
situação. Tarde demais! O rosto dela, segundos antes, pálido pela cor natural
da sua alva pele, estava agora tomando tons sombriamente escuros. Suas pernas
desfaleceram e seus braços puxaram sobre si o corpo do rapaz, na tentativa de
se segurar e evitar o tombo.
Só
aí ele percebeu tudo. Se debruçou sobre ela, abriu-lhe a boca que ela sacudia
para todos os lados na busca do ar que não vinha. Tentou verificar se conseguia
visualizar o objeto no fundo de sua garganta mas a sombra dos presentes
bloqueavam a luz da lâmpada da sala. Em desespero, colou sua boca na dela,
tentando incutir-lhe de forma forçada o seu sopro de vida. Lembrou-se que nunca
havia lhe beijado e intimamente, de forma ligeiramente mórbida ficou se
perguntando se aquilo contaria como beijo. Soprou forte o ar da vida, mas ele
levou a morte ainda mais ao fundo daquela garganta, fazendo com que o corpo
estranho fosse se alojar em local ainda mais inalcançável e trouxesse consigo o
terror dos estertores da morte.
Com
a sua boca ainda colada nos lábios da jovem, abriu os olhos e viu sua vida
ir-se embora com a menina dos olhos dela. E tudo se aquietou num silêncio
fúnebre enquanto se encaravam olhos nos olhos e percebeu que sua vida se fora
definitivamente junto com a dela. Como que hipnotizado pela dor, colocou sua
mão sobre os olhos daquela que lhe trouxera tantas alegrias e, lentamente, de
forma sofrida, foi deslizando as suas pálpebras de forma a fechá-las de modo
definitivo, enquanto na sua mente, voltava no tempo, lugar e forma de
conhecê-la: abrindo as suas portas para que ele entrasse em sua vida. Acabara
de fechar os olhos dela; acabara de fechar as portas do seu coração, de uma vez
por todas, para o mundo lá fora.
Autor: Charles Lucevan Rodrigues
Ji-Paraná/RO
Autor: Charles Lucevan Rodrigues
Ji-Paraná/RO
3 comentários:
Sem final feliz, aliás, um trágico o desfecho, mas sem dúvida , uma bela história de amor. E como se sabe, o amor também tem seus finais infelizes. Parabéns ao autor.
Inusitado. É o único adjetivo que me ocorre para classificar esse conto. As imagens literárias estão perfeitamente descritas e o final, surpreendente, deixa o conto ainda melhor. Parabéns a quem o produziu.
Alberto Vasconcelos
Ai que chocante!!! Mas as tragédias também fazem parte da vida... Parabens ao Autor que foi muito corajoso no desfecho do texto...
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