Autor: Willes S Geaquinto
Dolores tinha vinte e dois anos e
esbanjava graça e beleza, era clara, tinha cabelos louros, os olhos esverdeados
e mais ou menos um metro e setenta e altura. Tinha estudado um tanto e só parou
para ajudar a mãe na administração da fazenda que o pai deixara ao falecer.
Ainda não tinha namorado e reagia com indiferença aos rapazes que a assediavam,
apesar de alguns pertencerem a famílias importantes da cidade e serem
considerados bons partidos.
Embora a mãe fizesse questão de
protegê-la, Dolores não era assim tão frágil, já que boa parte do serviço da
fazenda era quem comandava. Os empregados a respeitavam muito, pois, como
crescera sempre acompanhando o pai, aprendera como tudo funcionava na
propriedade. Além de café e milho, a fazenda produzia leite e também criavam
cavalos de raça. O capataz chamava-se
Sebastião, um caboclo forte e dedicado, de um metro e noventa de altura que
trabalhava e morava com sua família nas terras da fazenda desde que o pai dela
ainda era vivo. Praticamente Dolores e Tião, como a família o chamava, tocavam
a fazenda a contento, enquanto Dona conceição cuidava dos outros afazeres.
Próximo à festa de Padre Victor, foram
até a cooperativa dos cafeicultores para acertar a participação deles na
cavalgada a ser realizada em homenagem ao padroeiro da cidade. Chegando lá o
gerente da cooperativa os apresentou a Dionísio, um engenheiro agrônomo
recém-formado, vindo de Viçosa para prestar assistência técnica aos cooperados.
Enquanto Tião foi tratar da cavalgada, Dolores e Dionísio entabularam uma
conversa como se já se conhecessem há muito tempo, o que não passou
despercebido ao Tião que na volta para a fazenda comentou com Dolores:
— Uai, você já conhecia aquele moço?
— Não, foi a primeira vez que eu o vi.
Achei-o bastante simpático e parece que é bem entendido na profissão dele.
— Ah bom, então vocês conversaram sobre
a fazenda?
— Sim, o que mais poderia ter
conversado, homem?
— Nada, apenas perguntei...
— Ele ficou de ir à fazenda fazer uma
visita técnica um dia desses...
Tião, mudando de assunto, contou que
estava tudo certo para participarem da cavalgada; disse que iriam com mais
alguns empregados representar a Fazenda Bela Vista no evento.
Quando chegaram à fazenda Dona
Conceição perguntou por que demoraram tanto tempo na cooperativa. Então Tião
explicou sobre os acertos da cavalgada e Dolores contou que conhecera o novo
engenheiro agrônomo da cooperativa. Ela ouviu e prestou atenção ao entusiasmo
da filha ao falar do rapaz. Depois perguntou ao Tião sobre o tal agrônomo, ao
que ele respondeu reticentemente:
— Parece ser muito estudado e entendido
da profissão, e é bem recomendado pelo povo da cooperativa. A Dolores conversou
um tempo com ele e foi só.
Meneando a cabeça deu por encerrado o
assunto. Depois passou a conversar sobre os preparativos da cavalgada no dia da
festa do Padre Victor, do qual era devota fervorosa.
Desde a manhã em que conhecera Dionísio
na cooperativa, Dolores volta e meia lembrava-se do rapaz, dos seus modos
educados e da sua simpatia. Parecia que alguma coisa dentro dela estava
despertando, só que não sabia bem o que.
Chegou até sonhar que cavalgava com ele pelas terras da fazenda...
Chegado o domingo da festa, Dolores
acordou cedo e foi com o Tião preparar os cavalos. Depois de tomar um café
reforçado, eles seguiram em direção à praça da igreja de Nossa Senhora
Aparecida, local de onde partiria a cavalgada que, depois de percorrido uns
sete quilômetros, iria findar em uma capela de um bairro rural denominado
Faxina onde, segundo contam os devotos, o santo padre tinha o costume de rezar.
Tão logo chegou ao local, Dolores
observou com certo contentamento que lá estava o Dionísio montado num cavalo
branco de belo porte, aproximou-se dele e comentou:
— Não sabia que você também gostava de
montar a cavalo...
— Eu fui criado numa fazenda onde a minha
diversão preferida era cavalgar...
— Interessante eu também gosto de
passeios assim...
Deu-se início à cavalgada e os dois
seguiram lado a lado, com Dolores montada em seu cavalo predileto, um puro
sangue lusitano preto, raro na região, que ela tratava com muito desvelo. Mais
atrás o Tião observava com certo gosto o casal cavalgando juntos, apesar de
saber que Dona Conceição talvez não fosse apreciar a novidade. Na verdade, ele
nunca tinha visto Dolores tão à vontade como ao lado de Dionísio.
— Isso vai dar o que falar, pensou
Tião...
Ao entardecer quando regressaram,
Dolores e Dionísio se despediram alegremente, com a promessa de brevemente ir
visitá-la na fazenda.
Mal a semana começou, os comentários
sobre o casal já corriam à solta pela cidade, por isso Dona Conceição chamou o
Tião para conversar:
— Então Tião, é verdade que os dois não
se largaram durante a cavalgada?
— Eles cavalgaram juntos e lá na Faxina
também ficaram proseando...
— E você percebeu se ela estava
interessada no rapaz?
— Aí isso eu não sei, só sei que
pareciam bem animados, acho que a senhora devia conversar com ela sobre esse
assunto, eu não tenho muito que comentar...
— Está bem Tião, vou conversar porque
já tem gente falando que eles estão namorando...
— A senhora sabe que o povo fala
demais, não é mesmo?
— É eu sei, mas fico preocupada...
Quando Dona Conceição acabou de falar,
Dolores entrou na cozinha...
— Do que tanto conversam vocês dois?
Tião só deu um resmungo e tratou de
sair, deixando as duas sozinhas. A mãe então falou:
— É que eu estava preocupada como
falatório sobre você e o agrônomo da cooperativa, dizem que vocês não se
largaram durante a cavalgada...
— Ora mãe, o povo fala o que quer, nós
apenas ficamos juntos e conversamos muito, o Dionísio é uma pessoa bastante
interessante, daí a boa prosa...
— Boa prosa? Então foi só isso?
— E o que mais poderia ser? Conversar
faz bem, o povo daqui é que é muito xereta!
E assim, tudo ficou até na terça-feira,
quando logo cedo Dionísio apareceu na fazenda onde foi recebido por Dolores e
pelo Tião. Trocaram cumprimentos e depois o levaram para conhecer a fazenda.
Dionísio trocou algumas opiniões com o capataz sobre a colheita e o
beneficiamento do café da fazenda e depois seguiram conversando outros
assuntos.
Passado algum tempo Tião voltou para a
sede da fazenda deixando Dionísio e Dolores sozinhos junto à cocheira dos
cavalos, pois, tinha percebido que eles tinham coisas para conversar em
particular. Chegando lá encontrou Dona Conceição um tanto ansiosa, pois não
estava presente no momento em que o rapaz chegara à fazenda. E assim que ele
chegou ela foi logo indagando:
— Então o que moço veio fazer?
— Ele veio visitar a fazenda, conhecer
o lugar para fazer um planejamento...
— Uai, desde quando nós precisamos de
alguém para planejar as coisas para nós?
— Isso faz parte dos planos da
cooperativa para aumentar e valorizar mais a produção dos cooperados, isso foi
o que explicou...
— Se é assim, tá bom. E a onde eles
estão agora?
Como resposta à pergunta da Dona
Conceição, eis que chegaram Dolores e Dionísio. Meio desconcertada cumprimentou
o rapaz que lhe estendeu a mão se apresentando. A partir dai foi um
interrogatório sem fim; queria saber tudo sobre ele. Dolores que ora olhava
para a mãe, ora para o Dionísio, tentava disfarçar o incomodo que estava
sentindo. Por outro lado, ele estava tranquilo, respondia a mãe dela com certo
prazer, pois, parecia entender o que estava acontecendo.
Por fim Dona Conceição convidou
Dionísio para experimentar o café da fazenda e as quitandas que ela mesma
preparava. Dolores e Tião ficaram aliviados com a mudança de tratamento da
matriarca para com ele e sentaram-se à mesa para saborear o farto café.
Depois, a sós, antes de ele ir embora,
Dolores pediu desculpas pelo interrogatório da mãe:
— Não se preocupe, a sua mãe faz muito
bem em zelar por você...
— Então você a entendeu, né!
— Sim, entendi. Agora vamos falar de
nós...
Quando ouviu essa última fala, Dolores
estremeceu ficando quase sem palavras:
— De nós?
— Sim, desde o primeiro dia que nos
encontramos na cooperativa e depois na cavalgada eu percebi que há uma boa
sintonia entre nós, partilhamos de alguns gostos em comum, temos certas
afinidades, então eu gostaria de pedir que fôssemos namorados...
Naquele momento Dolores sentiu como se
estivesse flutuando em alguma nuvem, que algo dentro dela estava se rompendo e
abrindo-se como se fosse luz ou algo semelhante. Passou a mão pelos cabelos
louros, respirou e respondeu:
— Sim, eu aceito que sejamos namorados,
mas, para sempre...
Dito isso, deu a mão para Dionísio como
se estivessem selando aí o compromisso de ficarem juntos, para sempre.
Depois desse dia passaram-se seis meses
até que Dolores e Dionísio, com as bênçãos de Dona Conceição e do Padre Victor,
se casaram. E pelo que se sabe, até os dias de hoje estão todos muito felizes;
têm um belo casal de filhos e todas as tardes cavalgam pela fazenda,
namorando...
Autor: Willes S Geaquinto - Varginha/MG
Autor: Willes S Geaquinto - Varginha/MG
2 comentários:
Excelente texto, rico em imagens literárias e perfeitamente dentro dos parâmetros do concurso.
Parabéns a quem o produziu.
Alberto Vasconcelos
E é ponto para o amor! Dionísio e Dolores, unidos pela letra "D", escrevendo a história do Para Sempre. Parabéns ao autor!
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