domingo, 27 de novembro de 2016

Bodas

Autor: José Bueno de Lima

O tempo é de casamento. Não foi só na Inglaterra que aconteceu. Aqui também tivemos o nosso. Claro que não dá para comparar. Não temos a Abadia de Westminster, o Palácio de Buckingham, as carruagens puxadas pelos pomposos cavalos, nem a guarda real, com seus uniformes magníficos. E, muito menos, príncipe.
Durvalina e Genival se conheceram numa roda de samba. Numa daquelas em que os bambas do partido-alto eram encontrados. Entre eles Aniceto do Império, Candeia, Xangô da Mangueira, Geraldo Babão, Clementina de Jesus, e tantos outros.
Ela, diarista de casa de família, morando no Vidigal, era uma cabrocha daquelas que, se Sargenteli ainda vivesse, não teria dúvida em contratá-la para sua “troupe”. Um corpo escultural. Dançava samba como ninguém! Mas, de uma seriedade a toda prova! Com ela não havia aquela história de, olhou, deu uma piscada, já estava nos braços do galanteador! Não! Era preciso ter muitas qualidades para conquistá-la. Vivia sozinha. Apesar de ficar na favela, sua casa, de alvenaria, era um primor de ajeitada. Tudo no seu lugar, a cozinha sempre limpa, equipada com fogão moderno, geladeira “frost free”. A sala, pequena, com sofá de dois lugares, e uma TV de 20 polegadas, tela fina. Assim arrumadinho era seu quarto, com cama de casal, e um guarda-roupa bem organizado. Banheiro impecável. Dava inveja à vizinhança. No trabalho, então, poder-se-ia encontrar alguém igual, o que já era difícil. Melhor jamais. Feliz a dona-de-casa que tivesse Durvalina como sua auxiliar de limpeza. Para completar, em algumas das casas em que trabalhava, era contratada para cozinhar. Excelente, também, no fogão!
Diante de todos esses predicados, sua fama era de uma mulher ideal, e o homem que tivesse a felicidade de conquistá-la como companheira, poderia levantar as mãos para os céus, em agradecimento a Deus.
Genival, por sua vez, não foi à toa que conseguiu Durvalina. Trabalhador, solteiro, morava ele em Ramos, membro da Sociedade Amigos de Ramos, onde exercia o cargo de diretor. Era funcionário da Secretaria de Saúde do Estado, todavia, na área burocrática. Sério, um servidor cumpridor fiel de suas obrigações. Jamais deixava seus deveres para amanhã. Arquivos sempre atualizados. Também era um afro- descendente.
Sua paixão era o samba, e, nos fins de semana, não deixava por menos, ia para o reduto dos sambistas famosos.
Numa dessas ocasiões, conheceu Durvalina. Quando vislumbrou aquela mulata, foi como um raio fulminante. Um clarão turvou sua visão! Fechou os olhos, como se estivesse num sonho, jamais acreditando no que via. Aquele rosto bonito, corpo maravilhoso, lábios carnudos, tudo conjugado com a simpatia da moça, logo se sentiu conquistado.
Durvalina, como era de se esperar, apesar de ter se simpatizado com Genival, não deu qualquer demonstração de interesse. Apenas sorriu. Ela percebera que havia impressionado aquele desconhecido. Trocaram palavras, simples amenidades, não passando disso. Entretanto, mais tarde, já bem descontraída, houve uma abertura, da qual ele se aproveitou, convidando-a para novos encontros.
Assim, pouco a pouco foram se conhecendo. Cada vez mais Genival se sentia atraído por Durvalina. Sua doçura, meiguice, sinceridade, todas essas qualidades, e as provas de excelente dona-de-casa que demonstrava ser, deixavam-no tranquilo, com a certeza de que teria nela, uma grande companheira. Sem falar em seus atrativos como mulher bonita, atraente, que impressionava qualquer cidadão que a visse.
Com Durvalina acontecia a mesma coisa. Via em Genival um homem honesto, trabalhador, sério, fiel cumpridor de seus deveres, demonstrando que haveria de ser um bom marido, e um ótimo pai. E, não deixava de ser um bonito mulato.
Além disso, tinham em comum, algo que adoravam fazer: dançar. O samba estava no sangue deles.
Um dia, dançando na Estudantina, conhecida gafieira carioca, Genival diz ao ouvido de Durvalina:
- Você quer casar comigo? Ela arregalou os olhos, surpresa pelo momento, conquanto já o esperasse.
- Claro meu amor, é a coisa que mais queria ouvir de você! E deu-lhe um sonoro beijo.
Daí em diante, começaram a traçar os preparativos. Durvalina, muito consciente, com os pés no chão, elaborou uma lista bem minuciosa de tudo o que mais precisavam, a fim de concretizar o desejo. Genival, então, confessou a ela já haver todo o necessário. Durante o tempo de namoro, com muita cautela e sem alarde, fora adquirindo móveis, aparelhos domésticos. E a casa onde morava, sendo de sua propriedade, toda reformada, iria ser a residência do casal.  Estava totalmente mobiliada.
Marcaram a data: 29 de abril de 2011.
Por coincidência, o mesmo dia do casamento do príncipe William e a plebéia Kate, na Inglaterra. Naquela sexta-feira, Durvalina acordou mais cedo, e assistiu, inteirinho, o casamento real. Ficou mais ansiosa! Tinha plena noção das diferenças entre as duas cerimônias.
Mas, sentiu-se feliz!
Cerimônia simples, na Igreja de Nossa Senhora da Penha, e recepção na quadra da Escola de Samba Estação Primeira da Mangueira. Com direito à exibição da mesma, durante a festa.
Mais ou menos às 22:00h, quando a comemoração estava no auge, Genival lembrou-se de algo muito importante. Imediatamente, largou Durvalina no meio da pista de dança, e do mesmo jeito que estava vestido, saiu em desabalada carreira, rumo à sede da Sociedade Amigos de Ramos.
Lá estavam todos os seus documentos necessários.
Por esquecimento, no corre-corre dos preparativos do casamento, deixara de efetuar a declaração e enviar seu Imposto de Renda, cujo prazo de entrega venceria dali a menos de duas horas!
Foi cumprir seu dever!

Autor: José Bueno de Lima - Santo André/SP

domingo, 20 de novembro de 2016

A turma da bomba dágua...

Autor: Magnu Max Bomfim

Ultimo ano de faculdade, ultimo semestre, cinco anos longe da família, uma vontade danada de voltar pra casa, foi quando um dos nossos professores resolveu transformar em realidade aquele sonho que sempre acalentava e que sempre adiava, ele comprou uma imensa motocicleta e saiu a rodar pela cidade, na primeira curva a máquina derrapou e no descontrole caiu sobre a sua perna esquerda esmagando-a, e disto resultou um acréscimo ao seu corpo de mais de uma dúzia de parafusos, algumas placas de platina e uns seis meses de repouso, fisioterapia, muletas, etc.
Às presas a universidade contratou um substituto, ou melhor, uma substituta, uma moça alourada, recém-formada, ríspida, durona, não era alta, dona de uma beleza contagiante, dona também de uma firmeza monolítica na condução dos seus propósitos.
Naquela época não éramos bem vistos por fazermos parte de um conjunto musical que treinava em um barracão ao lado de uma imensa caixa d’água, e de imensas bombas de recalque, nosso conjunto musical tinha até um pomposo nome em inglês, mas os invejosos nos apelidaram de A Turma da Bomba D’água, e por mais que tentássemos nos livrar daquele maldito apelido mais aquilo em nós grudava, impregnava, por fim assumimos, éramos a Turma da Bomba D’água, com todos os seus defeitos e toda a sua má fama, moços da boemia que tocavam em troca de sanduíches, diziam...
A nova professora ao que parece fora alertada da nossa fama, e que apesar de vivermos na noite tirávamos boas notas, na certa éramos craques na arte de colar, pois estrategicamente sentávamos lá no fundo da classe, nas últimas carteiras:
— Nas minhas aulas eu quero que a Turma da Bomba D’água sente aqui nas primeiras carteiras, por favor rapazes!
Nós que gostávamos de Fernando Pessoa tínhamos como lema: Contornar é preciso, confrontar não é preciso, obedecemos, para o delírio da turma.
Tem certos momentos em que sentimos que estamos sendo observados, que alguém está olhando pra gente e não sabemos quem, assim eu me sentia naquele momento, levantei olhos e deparei com os belos olhos da professora ternamente em mim fixados, o tempo parou e naquele profundo silêncio que se seguiu e eu tenho a absoluta certeza que ouvi daquele olhar, palavras de amor, seus olhos levemente sorriram e ela olhou para outros cantos da sala de aula, despistando.
Aquela nova professora queria mostrar serviços:
— Pesquisem no livro tal da página tal a tal e apresentem uma sinopse na próxima aula!
Já estava começando a odiar aquela moça, mas também já estava começando a amá-la, das vezes na biblioteca perdido entre pesquisas e mais pesquisas ela aparecia toda sorridente:
— Estou gostando de ver vocês aqui...
Sentava ao meu lado, dava algumas dicas de como fazer um trabalho apresentável, mas quando eu olhava nos seus olhos um calafrio percorria todo o meu ser, seus olhos transmitia mensagens que o meu coração seguramente traduzia que ela de mim estava gostando, por fim arrisquei:
— Será que tenho uma mínima chance de algum dia ser seu namorado?
— Se você abandonar aquele conjunto musical, ser mais responsável, ou melhor, ter um comportamento de bom moço, com certeza existe uma mínima chance de sermos mais que amigos!
Comecei a faltar aos ensaios do conjunto, por fim cansaram e me substituíram por um estudante gaúcho, um rapaz espevitado, dono de uma energia contagiante, na certa a minha ausência não foi sentida na Turma da Bomba D’água...
Morávamos perto da universidade, à noite gostava de ficar sentado em volta daquelas mesinhas que ficam nas calçadas em frente aos barzinhos, foi quando vi um carro se aproximar e dele desceram três moças, minha professora e duas amigas, me cumprimentaram, sentaram, conversaram, desconversaram, e as duas amigas com as mais esfarrapadas desculpas teriam que visitar uma pessoa conhecida delas que estava adoentada, partiram, neste instante um maluco guiando um imenso carro preto, brecou seu veículo com tamanha violência que derrapando chegou a roçar os pneus na calçada, o moço saindo do carro apressadamente entrou no bar deixando o rádio ligado com o som nas alturas, Eric Clapton cantava... “While my guitar gently weeps”... Ao ouvir aquela música meu coração não resistiu:
— Eu não sei o que o amanha reserva pra nós, mas de uma coisa eu tenho a  absoluta certeza, seja lá onde eu estiver, toda vez que ouvir esta música vou me lembrar de você...
Segurando as suas mãos, lentamente nossos lábios foram se aproximando, e um beijo daqueles de perder o fôlego foi incendiando a minha alma por inteiro descompassando meu coração.
Ela sorrindo:
— Você nem me pediu em namoro, mas agora isto nem é mais preciso, pois já estamos enamorados. Abraçamos e beijamos tantas vezes que...
No outro dia na universidade o assunto do dia era o nosso namoro, os beijos e abraços foram exagerados, mas seguramente eu estava vivendo os mais belos e os mais felizes momentos da minha vida!
“A felicidade é uma coisa estranha e esquisita, das vezes nos visita somente para provar que ela existe”, e assim foi...
Convidaram-me para ir até determinado barzinho, onde iríamos tratar de assuntos referentes à festa da formatura, mas lá chegando assim que sentei apareceu uma moça que usava trajes curtíssimos, blusa decotadíssima, toda pintada, nunca a tinha visto, inesperadamente se sentou no meu colo, a muito custo consegui me desvencilhar daquela doidice...
Agora, eu, um rapaz surpreendentemente comportado, na sala o meu amor adentra para ministrar mais uma aula, foi quando ela ao abrir a gaveta da sua mesa deparou com alguma coisa estranha que a transmudou, transfigurou e entristeceu...
Calmamente ela de mim se aproximou:
— Deixaram na minha gaveta, mas isto te pertence...  
E me entregou uma fotografia, e nela claramente via aquela moça aloucada no meu colo sentado, me abraçando...
— Posso explicar?
— Não há necessidade de explicações, a foto por si explica tudo...
Nunca mais a professora olhou nos meus olhos, se ela tivesse uma mínima oportunidade certamente teria me reprovado na sua matéria, tentei de todas as maneiras lhe explicar o acontecido, mas tudo em vão, seguimos os nossos caminhos, ela com a sua mágoa e eu com a minha dor, foi quando me lembrei do filósofo alemão Nietzsche que dizia...
“Na vingança e no amor a mulher é mais cruel que o homem”...
Que paradoxo! Eu que queria tanto voltar pra casa, agora que estou voltando, sinto que não mais quero voltar, todavia tenho que voltar, pedaços meus vão ficar aqui... Para sempre...
Ao ouvir aquela música, do fundo da minha alma doces recordações do tempo da universidade descontroladamente avivam e ganham cores na minha mente, meus colegas, meus professores, meus amigos da Turma da Bomba D’água, mas são as lembranças daquela moça as que mais pesam alma minha adentro, as que mais me entristecem, mas também as que mais me alegram...
Assim os anos foram passando e da professora sempre me lembrando, longe dela me sentia o mais infeliz dos infelizes, quantas vezes juntava forças e coragem para procurá-la, mas ao lembrar que ela implorou para que eu nunca mais a procurasse, que a esquecesse de uma vez por todas, um vendaval de tristeza e desanimo açoitava a minha alma imobilizando-a por completo...
Mas ela nunca deixou de povoar os meus sonhos, das vezes contemplava a minha desgraça e sorria amargamente para os meus pensamentos delirantes, bobeiras e mais bobeiras, sonhos impossíveis, sonhava com ela nos meus braços, abraços apertados, beijos prolongados...
Suspiros...
E mais suspiros...
Foi quando recebi um convite para as comemorações dos cinco anos da nossa formatura, confirmei a minha presença, e no dia da festa, à noite, cheguei atrasado, quase todos meus antigos colegas estavam presentes, vários professores, a turma da Bomba D’água, ansioso, com o olhar procurei-a por todos os cantos do salão, mas tudo em vão, para a minha tristeza e desespero não a encontrei, fazer o que? Refleti, talvez ela nem se lembre mais de mim, talvez até já tenha se casado, cabisbaixo, tentando enganar a mim mesmo concluí... “Esta infelicidade não vai durar a vida inteira, outro amor eu hei de encontrar” e fui abraçando e sendo abraçado por tantos e entre sorrisos e lágrimas...
Você se lembra disto, se lembra daquilo, bebidas rolando, uns dançado, mas o bom mesmo era a algazarra causadas pelas pitorescas recordações de acontecimentos marcantes, lá pelas tantas da noite, quando o cansaço já tomava conta de todos eis que ela adentra ao recinto da festa, linda, meigamente linda, muito linda, toda sorridente, minha querida professora, minha paixão, meu único e verdadeiro amor, mas para minha decepção chegou abraçada com um rapaz desconhecido, me amaldiçoei de mil maldições por ter vindo a este encontro, neste momento eu queria mesmo é me esconder debaixo de alguma mesa, ela a todos cumprimentando e abraçando, foi quando notei que todos os olhos estavam voltados para mim, aquilo me sufocou, minha boca secou, meu corpo tremulava, mal se sustinha, e ela foi se aproximando...
Aproximando...
Aproximando...
Quando finalmente me estendeu a mão, nossos braços se abraçaram, e voltaram a se abraçar, por fim consegui perguntar se tudo estava bem, ela sorrindo, devia estar sorrindo do meu desespero, disse que estava com saudades de toda aquela turma. Ela se misturou na multidão, frustrado, me refugiei num canto qualquer, não tenho o hábito de ingerir bebidas alcoólicas, mas foi nelas que procurei o alivio para a minha derrota, um consolo para a minha desgraça, depois de algum tempo já completamente embriagado comecei a declamar a minha desventura, quando algo inesperado aconteceu, não me lembro da maneira exata do acontecido, mas só sei que ela sorrateiramente de mim se aproximou e disse:
— Por tanto tempo esperei pela sua volta, e você não voltou, por tanto tempo esperei por um telefonema seu, e você não telefonou, esperei por uma mensagem, e esta mensagem não chegou, agora o tenho perto de mim e você não me diz nada?
Com imensas dificuldades consegui falar:
— E aquele rapaz?
— Que rapaz?
— Aquele que você entrou abraçado na festa?
— Deixa de ser ciumento, aquele rapaz é o professor que me substituiu na Faculdade, é meu amigo, e o que tem demais abraçar um amigo!
— Caramba, então toda essa minha bebedeira foi em vão? Mas você não precisava entrar na festa tão agarrada naquele sujeito!
E a turma me desafiava para que falasse aquilo que todos esperavam!
— Vamos, desembucha companheiro, a hora é agora, e não terá outra oportunidade igual a esta pelo resto da sua vida!
Empurraram-me para bem perto dela, ficamos de mãos dadas, mal conseguia me equilibrar, a cabeça girava, o corpo tremulava, foi quando tive um momento de lucidez, ajoelhei e segurando ternamente em suas mãos, olhei para os seus olhos e gaguejei:
— Caaaaasa cooomigo!
Ela soltou das minhas mãos, olhou para a multidão silenciosa que aguardava o desfecho daquele drama, olhou para mim...
Sorrindo, toda feliz, retrucou:
— Lembra-se daquela foto? Eu ainda hoje a tenho nas minhas lembranças, mas há muito tempo eu já te perdoei, perdoei porque sei o quanto te amo. Ao te ver meu coração recuperou a antiga felicidade e se fez em festas e alegrias, eu aceito o seu pedido de casamento! Mas tem uma condição, vamos agora até a minha casa e você pede aos meus pais autorização para casarmos, e este casamento terá que ser realizado dentro de no máximo trinta dias!
— Trinta dias?
— Trinta dias sim senhor!  Já passei dos trinta anos, e não pretendo perder mais tempo com namoro e noivado, quero ter muitos filhos...
A festa foi interrompida, aqueles colegas, muitos, nos acompanharam até a casa dela, e aí que o vexame ficou pior, na entrada tropecei em um tapete e estatelei na sala caindo aos pés dos meus futuros sogros, graças à ajuda de meus amigos consegui ficar de pé, cambaleando e com uma voz melosa disse boa noite aos pais dela, que surpresos não estavam entendendo nada do que estava acontecendo.
E um engraçadinho foi logo avisando que eu estava ali para um pedido de casamento! E a minha futura sogra abriu a boca:
— Minha querida filha você perdeu o juízo, ficou louca, vai casar um traste deste, um pingaiada, se solteiro já bebe assim, imagine quando casar, ficará pior!
— Mamãe, tenha um pouco de paciência depois eu explico tudo!
— Minha filha escuta sua mãe pelo amor de Deus, acorda, se livra desta tentação, o que foi que você achou neste pinguço, na certa também não gosta de trabalhar, você vai ter que sustentá-lo pelo resto da sua vida, você será uma mulher infeliz ao seu lado!
— Mamãe, papai, o deixe falar, por favor!
E o pai dela, um senhor de barriga saliente, ar de bonachão, sorria daquela palhaçada pelos cantos dos olhos, finalmente abriu a boca:
— Minha querida filha é este rapaz com quem você deseja casar?
— Sim papai!
—  Se é este o seu desejo, se é esta a sua decisão, eu respeito e acato, mas fique sabendo ao que tudo indica você fez uma péssima escolha, melhor morrer solteira do que mal casada, e não diga que não te avisamos, depois será tarde, muito tarde para lamentar, vamos rapaz, fale, desembucha de uma vez por todas, somos todos ouvidos!
Fez-se um silêncio sepulcral dentro daquela casa, dava para ouvir o ronco dos automóveis lá na rua, lágrimas escorriam pela minha face, sou assim, quando emocionado lágrimas escorrem e não consigo contê-las, e a turma torcendo  para que eu conseguisse destramelar a língua, que falasse e  falei, molemente, mas consegui gaguejar:
— Antes de tudo eu queria pedir desculpas pela minha maneira desastrada de entrar em vossa casa, acreditem, eu não sou o que estão vendo, sou um rapaz responsável e trabalhador, quero lhes dizer que sou completamente apaixonado pela sua filha, que ela foi, é, e será sempre o amor da minha vida, e que serei feliz somente se ela estiver ao meu lado, assim sendo, com todo o respeito eu gostaria de pedir a sua filha em casamento!
Casamento marcado, voltamos para o salão e a festa continuou madrugada afora até o dia clarear...  
Casamos, com o tempo tornei o genro querido dos meus sogros, minha esposa encheu a casa de filhos, os filhos cresceram, formaram, debandaram, cada um seguiu seu caminho, e o tempo passou tão de repente, envelhecemos e ainda hoje estamos apaixonados, e ela continua recebendo flores no dia do seu aniversário, mas o que mais gostamos é de relembrar o nosso passado, dos nossos momentos de tensão, de alegrias, de tristezas... São estas coisas que dão um colorido especial em nossas vidas!
Com toda razão está quem diz...
“ Deus escreve o certo pelas linhas tortas”.

Autor: Magnu Max Bomfim - Igarapava/SP

segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Quem come galinha choca perde os pelos das sobrancelhas

Autor: Geraldinho do Engenho

Sou um pequeno comerciante há quase meio século, embora já aposentado não consiga me privar do convívio de minha clientela. Toda profissão tem lá seus dissabores, mas o prazer de servir para quem ama a profissão supera tudo.  E a amizade nos gratifica mais que qualquer ganho financeiro. Têm clientes dos mais variados comportamentos, um fator que exige habilidade para tratar cada um, no seu modo ser; cliente meneado, brincalhão, chato, agradável, inconveniente, divertidos etc. Às vezes o caboclo tem pouca leitura, mas é bem informado e encontrando alguém capaz de lhe dar atenção torna-se um verdadeiro cômico.
Cavanhaque é meu cliente a mais trinta anos. É o roceiro mais bem informado, que já conheci. Todo acontecimento que esta na mídia ele Sabe discutir, e tem uma opinião formada, é tão bem conceituado como qualquer especialista no assunto.
A pouco em minha loja conversando com um vendedor que dizia das dificuldades enfrentadas com a pensão de duas ex-esposas, o Cavanhaque logo palpitou.
 – Então ocê não sabe da ultima? Neste caso a solução agora é desossar elas rapaz !
O moço achando graça na sua conversa bateu um longo papo com ele,horrorizados, com  respeito dos acontecimentos bárbaros ocorridos com várias mulheres nos últimos tempos.
No final nós todos nos divertimos com a história contada por ele, quando trabalhou como retireiro no sitio de um padre, nosso conterrâneo.
O padre sempre ia ao sitio com alguns colegas. Habituado a jogar baralho e comer galinha com arroz.
Certo dia Cavanhaque recomendou sua mulher, à cozinheira:
 - olha quando o padre pedir para preparar a galinha, ocê pegue aquela que esta aperreada La na varanda!  Já ouvi dizer que galinha choca é tiro que queda pra cair os pêlos das sobrancelhas e pestanas; vai testar esse negócio com o padre pra ver se é verdade!
- Têm muitos anos sô! Até hoje quando encontro com o padre, eu fito olhos nele pra ver se deu certo, mas é pura mentira cai coisa nenhuma!

Autor: Geraldinho do Engenho - Bom Despacho/MG