sábado, 30 de julho de 2011

Olha ¨O Grito¨ - Texto: Pierre Sobral

Pedem-me jovens estudantes da minha Custódia que me pronuncie sobre ¨O Grito¨.

¨O Grito¨, como antes vivemos ¨Custodianas¨, nasce sob a égide da vontade de acertar. A mocidade tem a ânsia de viver, de dinamizar, do querer acertar.

Certa anda esta mocidade, que se não leu, deve ter ouvido de alguém as sagradas palavras de Cervantes, que pontificou: ¨Esta mocidade de incentivo para quem não há pousada¨.

Só tenho palavras para estes jovens de estímulo, de admiração.

Se todos os jovens da geração atual resolvessem fazer jornal ou jornais, no aprimoramento de suas idéias que devem ser boas, certamente o útil e o agradável estariam bem unidos e o mundo seria bem melhor.

É o que penso e entendo.

Estou com ¨O Grito¨ e não abro.

Falei ...
Pierre Sobral


Ps: O blog Famílias Lopes & Santos informa:

Alguns comentários da época sobre o Jornal ¨O Grito¨

- Carlos, quero agradecê-lo pelo jornal que é realmente um símbolo da boa comunicação – José Francisco da Costa – Jupi PE

- Gostei muito do jornal e dou os parabéns a toda sua equipe – Verônica M. Gonçalves – Frei Miguelinho PE

- Obrigado pelo jornal da sua cidade, achei muito interessante – Mônica Maria Passos – Angelim PE

- Li ¨O Grito¨, gostei bastante, achei que Custódia está de parabéns. Espero que me enviem o próximo, queridos conterrâneos – Águida Vasconcelos – Serra ES

- Li ¨O Grito¨ e adorei, achei que a idéia foi genial, é um trabalho importante - Vandelúcia Batista - Arcoverde PE

- Está ótimo, espero que me envie o próximo. Para vocês os meus sinceros agradecimentos - Flávio Roberto - Fortaleza CE
- O jornal está uma beleza, continuem a luta por ele - Nelma Rodrigues - Volta Redonda RJ

- Agradeço-lhe pelo jornal ele é muito educativo - Luizita Lins - Lagoa de Itaenga PE

Outras hospedagens serão feitas de jornais que circularam em algum momento em nossa cidade. Estas postagens são interessantes pois nos remetem a registros da época e por si despertam a nossa curiosidade. É com grande satisfação que inicio com a mesma matéria que em 1979 o colaborador Pierre Sobral abençoou o nosso ¨O Grito¨. Além deste verdadeiro gênio ainda contei com os colaboradores: Osminda Carneiro, Silvio Carneiro, Fernando José, Antônio Remígio, José Assis, Maria de Fátima Ferreira, Herbert B Leal, Marleide Espíndola, Ernani R. Figueiredo, José Eugênio, Luciana Cristina, José Melo, Antônio Medeiros de Souza, Marcelo Burgos e Peter Peterson.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Exposição ¨Divinas¨ de Nino Ferreira


H Rocha Galeria de Arte E-mail garetehrocha@uol.com.br tel 5521-22271179 e 5521-85820008 Exposição Divinas de Nino Ferreira. Tour virtual da Revista Amigos Web. Conheça a exposição mesmo longe da galeria.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Entrevistando o pintor olindense Nino Ferreira













Foto Alexandre Svero

Pergunta: Quando é que despertou o gosto pelas artes?

Resposta: Eu sempre tive uma necessidade muito forte de expressão desde pequeno, eu diria mesmo que quase compulsiva e isso começou com o desenho. Não era uma questão de "gostar" de desenhar, era mesmo a necessidade de fazê-lo.

Pergunta: Foi na pintura que cresceu como artista e atingiu notabilidade. Onde descobriu essa vocação?

Resposta: Eu tinha uma amiga com uma ótima bagagem de conhecimentos técnicos sobre pintura e que me convidou para montarmos um atelier. A proposta era experimentar algumas ideias que já tinhamos. Só que depois de alguns meses ela resolveu buscar a arte no mundo acadêmico e eu decidí seguir a diante. Eu já possuia um caderno cheio de esboços e, o que era mas interessante, eles já pareciam carregar com eles um conceito. Assim nasceu minha primeira série entitulada "Evas".

Perguntas: Quais são os seus mestres na arte?

Resposta: Gustav Klint, Portinari, Vik muniz, Edgar Degas, Roy Lichtenstein, Adriana Varejão, tenho gostado muito dos trabalhos de Banksy.

Pergunta: Qual foi a obra que mais gostou de pintar? Qual a temática que mais gostou de pintar?

Resposta: Nessa série "Divinas" que estou apresentando no Rio eu pintei pela primeira vez em dimensões bem maiores do que estou normalmente habituado a pintar. Foi meio desafiador mas eu gostei muito do resultado final. As mulheres com assas me dão um prazer a mais em pintá-las. Pelo humor que elas carregam e pelo fato de nunca ficar muito claro se elas são anjos ou se suas asas são meros enfeites. Lembro que na época quando comecei a pintá-las eu estava muito inspirado por uma musica de Vange Leonel que dizia "essas asas que eu vejo em mim são como enfeites de natal prontas pra confundir o que é o bem e o mal...como um anjo demitido espero o tempo passar e perambulo esquecido sem ordens de Deus pra levar".

Pergunta: Quando pinta inspira-se numa temática, num objecto exterior a si, ou é puro exercício de intelecção?

Resposta: O objeto exterior definitivamente existe, seja ele uma musica, um filme, mas principalmente as pessoas ao meu redor. Eu sou um observador ligado na tomada as 24 horas do dia, nada escapa, a diferença fica por conta de como tudo isso é processado. Sou muito emocional na maneira de trazer tudo isso a tona. Eu entrego o "leme do barco" totalmente ao meu inconsciente ,ate mesmo por acreditar na precisão como tudo se amarra e se interliga no final.

Pergunta: Que reações a sua obra pode despertar nas pessoas?

Resposta: Num primeiro momento identificação, como falei acima, meu trabalho é muito emocional e isso parece chegar as pessoas principalmente através da combinação de cores que costumo fazer. Em outros momentos a reação é de um riso carregado de uma certa estranheza com aquilo que se vê.

Pergunta: O que pretende transmitir com a sua obra?

Resposta: Trazer de volta algo de nós que talvez tenha ficado pelo caminho sem nos darmos muito conta (inclusive o riso). Sabe aquela reação típica de quem encontra algo que lhe é caro e diz: "ei, isso é meu!"

Pergunta: Pinta para um estrato social específico? Qual o seu público-alvo?

Resposta: Eu ainda vejo o artista como alguém que produz para si mesmo, as pessoas que se sentem, por razões diversas, atraídas por seu trabalho é que formam, num movimento muito natural, o seu público, sendo assim, não consigo ver meu trabalho direcionado para um público-alvo.

Pergunta: Já lhe aconteceu pintar algo e não gostar do que viu?

Resposta: Muitas e muitas vezes. Quando uma serie fica pronta ela costuma deixar um rastro de telas destruidas. rsssss

Pergunta: Ainda passa muitas horas a pintar?

Resposta: Muitas. Nunca tenho noção de tempo quando estou pintando de forma que isso implica sempre em muitas horas diante da tela.

Pergunta: O local onde pinta é importante? Tem a companhia do rádio?

Resposta: Bom, já pintei em situações bem desfavoráveis sem comprometer o resultado final do trabalho. No entanto, o local ideal pra mim é aquele sem muitas interferências exteriores.  Quanto a musica, ela é parte fundamental do meu processo de trabalho.

Pergunta: Quando surgiu a idéia de fazer a mostra?

Resposta: A ideia da mostra surgiu em 2009 a partir de um convite da HR Galeria de arte que já conhecia meu trabalho e resolveram apostar nessa apresentação do meu trabalho para um novo público.

Pergunta: Como você definiria essa mostra?

Resposta: Essa é uma mostra que consegue condensar, nos 23 trabalhos expostos, a ideia central do meu trabalho hoje.

Pergunta: Você poderia falar um pouco sobre o que será apresentado na mostra?

Resposta: A mostra tem como ponto central as pinturas de figuras femininas com os seus jogos de cores intensas e os elementos que já criaram uma marca do meu trabalho como a ideia da mistura do religioso e do profano em um universo meio cabaré assim como uma certa ideia de "glamur decadente" que beira o kitch tudo isso numa estética bem pop. As Personagens por sua vez passeiam entre o humor meio displicente e uma certa melancolia. O segundo ponto da exposição são os trabalhos mais monocromáticos em que faço uso do carvão com cores chapadas ao fundo, geralmente em tons de terra. Nesse as figuras femininas são mais contemplativas. Elas carregam um lirismo mais evidente.

Entrevista feita em setembro de 2010 para o Jornal do Comercio do Rio sobre a primeira exposição de Nino Ferreira, realizada no Rio de Janeiro na Galeria Helio Rocha.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

A arte de Nino Ferreira - Texto: Carlos Lopes

                              Crédito da foto: Alexandre Svero

Tem quem diga que escrever sobre quem admiramos é fácil. Eu, particularmente não acho. Quando conheci Nino Ferreira, logo imaginei que a humildade, o carisma, habilidades com a cultura de um modo geral seria seu aforismo. Nada disso. Um belo dia fui surpreendido ao saber da sua afinidade com os pincéis. O meu admirado é um grande pintor de Olinda, do Brasil e do mundo, é claro.

Ao criar o marcador ¨Dica da Semana¨, logo Nino veio em mente. Fiz o convite e Nino aceitou. Nos próximos dias vamos conhecer um pouco mais desse talentoso artista da terra e de onde vem essa força inspiradora. Mas, como o cara também leva jeito com as palavras deixemos que fale por si:

Nasci em março de 1966 em Olinda , minha mãe nasceu em Barreiros e meu pai em Recife. Meus pais já carregavam uma grande coincidência em seus nomes Amara & Amaral o que (só pra fantasiar um pouco) deve ter sido um bom sinal. Apesar de não haver histórico de artistas na minha família, posso dizer que a habilidade para trabalhos manuais e para um certo censo estético já havia se manifestado tanto na minha mãe com seu trabalho em costura quanto no meu pai que trabalhava em uma gráfica.

A atmosfera de uma cidade como Olinda, principalmente por sua arquitetura já atiça o imaginário de qualquer criança e mais ainda o de uma criança que se sentia atraída pelas artes visuais.     
                
Comecei a pintar como os primatas, riscando paredes ... e num processo "evolutivo" muito particular, passei para o assoalho, portas, revistas, minha própria pele e por fim o papel. A aproximação dos materiais veio menos pelos livros que pelo faro. Na infância, para cada desenho feito, havia sempre uns tapinhas nas costas de "muito bem, muito bonito" o que parecia afirmar um possível talento "pra coisa".     

terça-feira, 26 de julho de 2011

Estudantes de Custódia perguntam ao Quinteto Violado

A entrevista que se segue faz parte do resgate de matérias antigas publicadas em jornais (ver rodapé da postagem: ¨Olhem o Grito¨), cujo objetivo principal é a curiosidade, evidentemente também são  excelentes registros. Em um blog como este que trata de relatos de vidas, o marcador deverá funcionar como incentivo a novas criações, como é o caso do texto ¨Nós e Os Violados¨ (ver matéria neste blog), criado a partir desta entrevista. Portanto, as observações feitas pelos integrantes do Quinteto Violado devem ser vistas com os olhos daquele ano de 1979, podendo nem representar o atual pensamento do grupo.

A ENTREVISTA

Pergunta: Em qual região do nosso país a música brasileira tem mais aceitação?

Marcelo: Realmente o Sul vive mais para música pela disponibilidade de espetáculos de música brasileira e também pela proximidade dos artistas.

Pergunta: A invasão da música estrangeira não dificulta um pouco?

Marcelo: Existe a invasão, mais a invasão no rádio vamos dizer. Discoteca, digamos, é um movimento que passa. Não chega a prejudicar. A gente sabe que passa como passou Holiday e outros. Ai você ver os rádios só tocando música estrangeira, estão dentro de uma cadeia de mecanismo políticos e econômicos que vivem da venda de uma série de produtos. No país de origem a música estrangeira já foi paga e aqui se incorpora a uma indústria. Mas isso acontece também no cinema, na literatura, etc.

Pergunta: Como é vista a nossa música no exterior?

Marcelo/Toinho: A música brasileira no exterior ainda é um elemento novo, não chega a ser totalmente desconhecida, porque os meios de comunicação estão muito desenvolvidos. Mas como difusão, como aceitação, como adaptação de um público no exterior para a música nordestina, isto não existe ainda, muito embora a música nordestina por ter uma riqueza de influências muito forte, desperta curiosidade pelas informações culturais de uma região. Os músicos que saem do Brasil levam influência nordestina e a gente já encontra um sabor nordestino em tratamentos musicais de outros músicos estrangeiros. No mês passado estivemos na Europa participando de um festival em Berlim, tocando exclusivamente a música Nordestina, dentro de um festival de cultura internacional onde a música regional, a mais primitiva de cada região, era o forte do festival. Esse festival concentrou-se fundamentalmente na África Negra. Lá estava o Brasil, era o único convidado não Africano, eles têm conhecimento da influência africana na nossa música.

Pergunta: Como os amigos viram o Pajeú como fonte de folclore? Qualquer que seja a resposta, o Moxotó não seria também uma contribuição positiva a esse valioso trabalho do Quinteto Violado?

Marcelo/Toinho: Trabalhamos da seguinte forma: retratando aquilo que já tinha sido sucesso através de compositores ou interpretes da região e ai tem uma infinidade de obras e autores, encabeçados por Luiz Gonzaga, Humberto Teixeira, Zé Dantas e Zé Marculino. Ou seja, é um tratamento atual, um tratamento instrumental mais contemporâneo, e aí alcançamos aquele público que originou todo o material que também identificou o nosso trabalho. Um outro tratamento é pegar o material já bonito pela sua naturalidade, pelo seu primitivismo, como são cantorias de reisados, Bumba meu boi, temas de Maracatu, Cirandas, já são coisas prontas e com pouca coisa se faz uma adaptação e mostramos quase na integra. A variedade é muito grande, o quinteto vem trabalhando esse material há oito anos. O Moxotó não se exclui, o Pajeú não se exclui. Nós temos uma pessoa aqui de Afogados da Ingazeira muito amigo nosso, o cantador de viola Raimundo Borges, forneceu um material incrível e hoje vamos utilizar. Portanto, é algo que também gostaríamos de ter da região de vocês, é só uma questão de mostrar ou enviar gravado pra gente.

Pergunta: O trabalho do Quinteto Violado já sofreu alguma censura?

Marcelo: Na realidade nunca tivemos problemas com a censura, apesar de que a música da gente não deixa de ser política. Inclusive até conseguimos trabalhos junto ao próprio governo. O que a gente canta é uma realidade tão grande que é impossível negar. Porém se determinadas músicas fossem cantadas por Chico Buarque com certeza seriam cortadas.

Pergunta: Qual a impressão colhida na missa do vaqueiro?

Marcelo/Toinho: A missa do vaqueiro pra nós representa um documento cultural da região, graças a um líder maravilhoso, um cara simples, um homem do povo, um misturado com os vaqueiros, um derrubador de gado que é o Padre João Câncio, mantendo aquela estrutura e segurando uma barra incrível. Aquela missa é envolvida de aspectos turísticos e culturais, específicos daquele povo, daquela região. E aí vem muita gente de fora para conhecer um pouco o comportamento o povo da região, as coisas que existem, a música, as brincadeiras e as vaquejadas. Agora tem que ser bem dosado para que não interfira no sentido principal deste encontro que é a missa do Vaqueiro, pois tem toda uma historia por trás que acredito que vocês conhecem, a historia de Raimundo Jacó. Esse encontro reúne poetas, cantadores, aboiadores, a própria figura do Vaqueiro, o homem no seu comportamento de trabalho, no seu dia a dia, seu traje, seus atos, costumes que ali se apresentam e a gente aproveitou, procurou dar uma dimensão e mostrar ao mundo aquela comunidade com a sua forma de vida. Fizemos um disco criado pelo poeta Janduir Filizola, que é um homem sertanejo, um cara que anda no sentido contrário do mar. Ele consegue dizer com palavras simples e bonitas toda uma ambientação, todo um aspecto cultural de comportamento deste povo e serve como porta voz poético de toda essa realidade. Nós tratamos o trabalho dele que foi feito especialmente para essa missa e resultou um disco que foi lançado na Europa e em outros países. Da Argentina recebi uma revista falando do comportamento deste trabalho que o Quinteto tinha feito com esse material musical. Na Alemanha foi escrito um livro e um capítulo foi sobre a Missa do Vaqueiro. Isto é, vem aqui, descobre e faz um trabalho para que o seu país tenha conhecimento desta realidade, que mostra o problema da violência, o porquê desta violência, o coronelismo, a posse de terra, o latifúndio, a submissão que vive o homem dentro da terra que não é dele, a necessidade de uma assimilação pela sociedade daquele homem vaqueiro que é para região o que é um operário dentro de São Paulo. Tudo isso tem sua importância e precisa que seja mostrado, seja conhecida pelos estudiosos e isso faz a historia de uma região ou de uma nação.

Pergunta: Amigos deis-mos notícias de Sando?

Marcelo: O Sando vem de uma família tradicionalmente que faz música clássica, são todos concertistas. A vontade do pai é que siga essa linha. Inclusive ele foi para São Paulo participar de um concurso de jovens instrumentistas, em Piracicaba. Ganhou três prêmios, três primeiros lugares.

Pergunta: Quem teve a idéia de fundar o Quinteto Violado?

Toinho: O Quinteto surgiu exatamente da idéia minha com o Marcelo. A gente já era amigos, Marcelo tinha saído do país desde que fez agronomia e foi fazer congregação na Europa. Eu fiquei aqui, terminei Química e comecei a trabalhar como gerente de uma fábrica. Marcelo estava voltando para o Brasil pra assumir uma cadeira na Universidade e eu o levei para conhecer fazenda Nova. E aí, resolvemos montar um espetáculo para fazenda Nova que foi apresentado em outubro de 1971. Houve uma aceitação muito grande e o trabalho foi crescendo chegando ao ponto que tivemos que optar, ou fazia a profissão normal ou fazia música. Criamos uma estrutura para ficar morando no Nordeste que era importante para nós. Com relação à origem, o Quinteto começou comigo (Toinho), Marcelo, Luciano baterista, Fernando Filizola que é violeiro e Sando na flauta. Depois tivemos a saída do Sando e veio Zé da Flauta. Ele se animou e montou um Estúdio de gravação em Recife. Agora tem um outro Luciano. Eu sou de Garanhuns, Marcelo é de Campina Grande, Luciano baterista é de Limoeiro, Fernando do Recife, mas foi criado em Limoeiro. Já Luciano, atual flautista é de Garanhuns e é meu sobrinho.

Entrevista concedida ao jornal ¨O Grito¨, em setembro de 1979.
Redação:

Carlos Lopes, Marleide Espíndola, Maria de Fátima Ferreira, José assis e José Eugênio.
Fizeram a entrevista:
Carlos Lopes, Fernando José, Antônio Remígio e Peter Peterson.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Elogio de um amigo chamado Paulo Andrade

Conheci Carlos Lopes quando trabalhei em Custódia na então recente inaugurada agencia do Banco do Brasil, e fiz parte do Grupo Teatral Os Gandavos, fundado por ele e mais alguns jovens que sentiram a necessidade de levar a sua mensagem através da arte cênica de representar.

Com o desejo de formação profissional muitos jovens haviam migrados para cidades como Recife, Salvador e Brasília, deixando-o sozinho. Por força e insistência sua conseguiu aderir ao grupo novos aliados que o ajudaram a recomeçar o trabalho e apresentaram a peça “Pluft o Fantasminha”, de Maria Clara Machado, em 21.04.77, ocasião em que o conheci  e daí passamos (eu, minha esposa Célia Regina e Antônio Remigio) a integrar o grupo.

Agregados, trabalhamos e montamos “Morre um gato na China”, de Pedro Bloch, em 23.11.77, que apesar de muitos obstáculos surgidos prevaleceu mais uma vez a sua capacidade de persuasão pela vontade de crescer, nos impulsionando para a estréia. A partir deste momento o grupo passou a só representar peças de sua autoria, por exemplo “Rua Torta”, em 06.03.78 e “Égua Gorda”, em 03.05.78.

Depois destas montagens, nós (eu, Célia e Antônio), tivemos que nos afastar de Custódia, deixando-o mais uma vez sozinho. Não desistiu. Continuou escrevendo e lutando pelo desenvolvimento cultural da cidade, ocasião em que fez circular um jornalzinho informativo (O Grito), criado por ele e amigos como Fátima Ferreira e distribuídos pêlos próprios. Cobravam, apenas, uma taxa para despesas com o fabrico. Por motivos outros que não vem ao caso citá-los, não veio a circular por muito tempo.

Sentindo-se mais uma vez sozinho, vendo a idade avançando e o fechamento do cinema do seu pai com o advento da televisão no Sertão do Moxotó, resolveu deixar a terrinha e descer rumo ao nível do mar. Lá, conclui o curso de Licenciatura em História na Universidade Católica de Pernambuco e se incorpora ao quadro funcional do estado.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Pais heróis e mães heroínas do lar - Texto: Isnaldo Lins

Passamos boa parte da nossa existência cultivando estes estereótipos.Até que um dia o pai herói começa a passar o tempo todo sentado, resmunga baixinho e puxa uns assuntos sem pé nem cabeça. A heroína do lar começa a ter dificuldade de concluir as frases e dá de  implicar com a empregada.

O que papai e mamãe fizeram para caducar de uma  hora para outra? Envelheceram. Nossos pais envelhecem. Ninguém havia nos preparado pra isso.

Um belo dia eles perdem o garbo, ficam mais vulneráveis e adquirem umas manias bobas.

Estão cansados de cuidar dos outros e de servir de exemplo: agora chegou a vez deles serem cuidados e mimados por nós, nem que pra isso recorram a uma chantagenzinha emocional.
Têm muita quilometragem rodada e sabem tudo, e o que não sabem eles inventam. Não fazem mais planos a longo prazo, agora dedicam-se a pequenas aventuras, como comer escondido tudo o que o médico proibiu. Estão com manchas na pele. Ficam tristes de repente.  Mas não estão caducos: caducos ficam os filhos,  que relutam em aceitar o ciclo da vida.

É complicado aceitar que nossos heróis e heroínas  já não estão no controle da situação. Estão frágeis e um pouco esquecidos, têm este direito, mas seguimos  exigindo deles a energia de uma usina. Não admitimos suas fraquezas, seu desânimo. Ficamos irritados e alguns chegam a gritar se eles se atrapalham com o celular ou outro equipamento e ainda não temos paciência para ouvir pela milésima vez a mesma história que contam como se acabassem de tê-la vivido.
Em vez de aceitarmos com serenidade o fato de que as pessoas adotam um ritmo mais lento com o passar dos anos, simplesmente ficamos irritados por eles terem traído nossa confiança, a confiança de que seriam indestrutíveis como os super-heróis. Provocamos discussões inúteis e os enervamos com nossa insistência para que tudo siga como sempre foi.  Essa nossa intolerância só pode ser medo. Medo de perdê-los, e medo de perdermos a nós mesmos, medo de também deixarmos de ser lúcidos e joviais. Com todas as nossas irritações, só provocamos mais tristeza àqueles que um dia só procuraram nos dar alegrias. Por que não conseguimos ser um pouco do que eles foram para nós? Quantas noites estes heróis e heroínas passaram ao lado de nossa cama, medicando, cuidando e medindo febres! E nós ficamos irritados quando eles esquecem de tomar seus remédios, e ao brigar com eles, os deixamos chorando, tal qual crianças que fomos um dia.É uma enrascada essa tal de passagem do tempo. Nos ensinam a tirar proveito de cada etapa da vida, mas é difícil aceitar as etapas dos outros...Ainda mais quando os outros são nossos alicerces, aqueles para quem sempre podíamos voltar e sabíamos que estariam com seus braços abertos, e que agora estão dando sinais de que um dia irão partir sem nós.

Façamos por eles hoje o melhor, o máximo que pudermos, para que amanhã quando eles já não estiverem mais aqui conosco possamos lembrar deles com carinho, de seus sorrisos de alegria e não das lágrimas de tristeza que eles tenham derramado por nossa causa. Afinal, nossos heróis de ontem serão nossos heróis eternamente.

domingo, 3 de julho de 2011

Perfil: Zé Biá - Texto: José Soares de Melo

Parece que estou vendo Zé Biá, aquele minúsculo corpo negro que abrigava uma figura humana extraordinária, quase que da mesma altura do balcão da Bodega que nos separava. Extremamente educado, chegava a parecer um serviçal, sempre atencioso,atento e acima de tudo respeitoso, tanto com os adultos como com as crianças. Dono de um talento invejável, sua Banda de Pífanos alegrou muitas gerações, nas festas religiosas, acompanhando as procissões, as novenas, os terços, animando os leilões, acompanhando o andor solitário de uma sertaneja, carregando uma imagem ao som de sua bandinha, pedindo donativos para a realização de uma novena. Também nos eventos sociais, Zé Biá se fazia presente. Acompanhando os batalhões de Bacamarteiros nos períodos juninos, sua banda fazia a alegria dos participantes e dos expectadores. “Mulé Rendeira” era pedido obrigatório naqueles eventos. Também era bastante pedida a “Briga do Cachorro com a Onça”, onde o pífano imitava o ganido dos cães quando atacados pela onça. Foram dezenas de anos nessa atividade, sempre presente nos eventos.

Recordo sempre os leilões da festa de São José que eram animados pela Banda de Zé Biá. O Pregoeiro anunciava os lances, batia o martelo –simbolicamente, com o famoso “dou-lhe uma”, dou-lhe duas” e “dou-lhe três”, que era a senha para bandinha saudar o arrematante com uma música.

Cheguei a assistir outros leilões na zona rural, nas famosas novenas que existiam naqueles tempo. E jamais esqueci o bordão que Zé Biá – dublê de músico e de pregoeiro, utilizava, quando anunciava os lances:

-“ Dois contos mi já dão pela galinha assada! Quem mi dá mais?”

Já no final de sua vida, exatamente no mês de setembro de 1978, Zé Biá encantou a produção da TV Universitária, que, cobrindo as festividades do cinqüentenário da cidade, gravou cenas interessantes. Zé Biá tirando as humildes alpercatas, faz inúmeras piruetas dançando o xaxado. Tudo documentado para apresentação no dia onze de setembro daquele ano, quando Zé Biá estrelou a programação que tinha o título de “Custódia, nossa Terra, Nossa Gente”, que tive a honra de participar com participações na apresentação do mesmo, ao lado do Prof. Humberto Vasconcelos e o artista plástico Marcílio Rinaux.

É uma pena que não tenha guardado aquelas imagens. Creio que no acervo da TV Pernambuco, ainda existam.

De uma humildade extrema, Zé Biá era verdadeiramente amado pelas crianças. Todos gostavam de conversar com ele, ouvir seus causos, sempre pontuados de bons conselhos, e extremamente alegre divertido. Era por assim dizer o líder da bandinha, composta por pessoas simples, humildes mas talentosos na arte popular. Zézé, branco, estrábico, tocava na caixa – espécie de tarol que requer uma habilidade imensa; Manoel da Rabeca, que era uma espécie de homem dos mil instrumentos: tocava a rabeca, o pífano e a zabumba, sendo também flandeleiro, barbeiro e detentor de outros ofícios. Raimundo, era um senhor alto, magro e que tocava a zabumba com maestria. Zé Benício era o mais gaiato da turma, tocava pífano, e também a zabumba, quando não estava fabricando e vendendo o “doce japonês”, iguaria que há dezenas de anos não vejo.

Que saudades daqueles tempos! Pena que jamais imaginaria que aqueles tempos, aquela bandinha, aquela gente era tão importante para nossa história e nossa cultura, o que só fez deixar o tempo apagar marcas tão importantes. Que bom seria que outros custodienses procurassem resgatar essa história, contando fatos, mostrando fotos, enfim, registrando quaisquer fatos relativos aquela Bandinha e o Gigante da Cultura Popular de Custódia, que foi Zé Biá.
Material publicado inicialmente no Blog Custódia Terra Querida (http://custodia-pe.blogspot.com/

sábado, 2 de julho de 2011

Os Gândavos

Como falei anteriormente em matéria publicada neste blog (Sobre o Grupo Teatral Astecas), no dia seguinte da apresentação de Pluft o Fantasminha, de Maria Clara Machado, Paulo Andrade me procurou na saída do cinema, dizendo-se satisfeito com nosso desempenho e queria contribuir com o grupo. Estava nascendo ali um novo Grupo Teatral. Aliás, o ressurgimento do Grupo Teatral Os Gândavos, fundado inicialmente  por Domingos Sávio, Fernando José, Jussara Burgos, Antônio Remígio, entre outros.

Paulo Andrade chegou a nossa cidade como um dos funcionários pioneiros do Banco do Brasil, provindo de Caruaru, onde foi engajado na arte de representar e em outros trabalhos comunitários. A partir deste momento os ensaios passaram a ser elaborados, inclusive com marcação de palco. Paulinho não só trouxe de sua cidade natal um empilhamento de ensinamentos, mas também sua ilustre esposa que se incorporou ao grupo na peça: “Morre um Gato na China”. O elenco foi composto pelo próprio Paulo Andrade no papel de Gastão, Célia Regina como Liane, cabendo a mim o personagem Sérgio, enquanto Antônio Remígio nos dava segurança no ponto.

¨Morre um Gato na China”, foi encenada no Centro Lítero Recreativo de Custódia, em primeira instância, no dia 23 de novembro de 1977. A obra prima de Pedro Bloch ficou encravada na história da dramaturgia local como a mais sucedida montagem e também como a única capaz de arrancar lágrimas da pláteia. A peça ainda foi levada às cidades de Monteiro na Paraíba e a Serra Talhada, onde foi encenada no Colégio Nossa Senhora de Fátima.

A segunda metade da década de setenta é positivamente o expoente maior da cultura custodiense. Além das tantas peças montadas por membros da própria comunidade, naqueles anos recebemos o ilustre fenômeno Nino Honorato com os monólogos: “As Mãos de Eurídice”, “Esta Noite Choveu Prata” e “A entrada de Lampião no Inferno”. Através de Paulo Andrade veio de Caruaru as peças “A Segunda Virgindade”, e a premiadíssima “Rua do Lixo 24”, apresentada em 21 de janeiro de 1978, pelo Grupo Feira de Caruaru, do próprio Vital Santos.

Com este grupo nascia também uma consciência coletiva no teatro custodiense. Esta mudança de mentalidade foi constatada durante e após as apresentações de ¨A Entrada de Lampião no Inferno,¨ e “A Segunda Virgindade.¨ Ou seja, as pessoas em sua maioria iam às peças por ser ¨uma novidade¨ mas não assimilavam bem o conteúdo. A partir daquele momento decidimos que os textos seriam de criação do próprio grupo.

Sob a direção de Paulinho, no dia 6 de março de 1978 fizemos três apresentações da peça de minha autoria “Como é Difícil Viver”, nos colégios: Técnico Joaquim pereira, Padre Leão e Joaquim Inácio. Logo no final da primeira apresentação, a estudante Leny ao ser entrevistada respondeu: “Gostei porque entendi”. A esta altura contávamos com os atores Fátima Ferreira, Magdália Chavier, José Wilson, Luciano Washington, Lúcia Maria, Luís William e Angélica Ferreira. No dia 3 de maio de 1978 estreamos: “Pedido de Casamento”, também de minha autoria. A partir daí compus mais seis peças: “Uma Vaga de secretária”, “Autarquia”, “O Filho Pródigo”, “Um caso Diferente”, “Rua Torta” e “O Ladrão que Nada Roubou”.

A exemplo da geração anterior chegara a hora de nos tornamos cidadãos do mundo. Paulo e Célinha se mudaram para Gravatá. Outros como eu, desceram ao nível do mar buscando faculdades e empregos. No apagar das luzes, com Marleide Espídola, Fátima Ferreira, José Eugênio, José Assis e uma gama de excelentes colaboradores, fundamos um jornal de circulação mensal sob o título “O Grito”, e assinei matérias em duas edições do Jornal Custódia Hoje.

Retorno às aulas

Nada é tão insatisfatório do que ter de retornar à cidade grande, após uma temporada de férias. Até mesmo o Recife que outrora me pareceu tão agradável, fica sem horizontes.

Material retirado para compor livro

 

O carinhoso - Texto: José Soares de Melo

Contam os mais vividos, que há várias décadas, quando a onda de cabeleireiro ainda não havia chegado a Custódia, que havia um barbeiro, cujo apelido era Carinhoso, famoso pelo seu linguajar autenticamente de sertanejo das “brenhas”.

O fato é que de certa feita, apareceu um cliente, – caixeiro viajante (hoje representante comercial) que resolveu tirar a barba com Sebastião Carinhoso. Contam que como sempre, o barbeiro conversou a mais da conta, sempre com seu linguajar característico. Ao terminar de raspar a barba, perguntou qual opção o cliente teria para arrematar o serviço e melhorar a aparência.

- “Vosmincê qué aico, taico ou qué qui mui?”.
(traduzindo: O sr. quer álcool, talco ou quer que molhe?)

Observando tantas palavras erradas em uma simples frase, dizem que o viajante fez uma proposta irrecusável a Carinhoso:

- Se você dizer a primeira palavra corretamente, eu pago a barba em dobro.

Espantado com a possibilidade de ganhar um extra, Carinhoso apressou-se em confirmar o que ouvira:

- Cuma?

Desnecessário dizer que Carinhoso perdeu uma oportunidade de ganhar um extra.

O outro lado da moeda - Texto: José Soares de Melo

Enquanto o ônibus quase vazio fazia o trajeto Boa Viagem-Piedade, veio-me a mente lembranças da minha infância na pequenina e então atrasada Custódia. E relembrei uns pobres versos que cometi recentemente, publicados neste blog, relembrando as coisas boas da infância e atentando para o fato de que só mencionei as coisas boas, as lembranças gostosas daquele tempo. Aliás, parece que ninguém gosta de lembrar o lado ruim de nenhum momento da vida. E questionei-me: porque? E comecei a lembrar alguns momentos que sinceramente não são bons de recordar. Por exemplo, topada. Qual o menino livre que naqueles tempos, brincando e correndo descalço pelas ruas da cidade, jogando bola de meia, não esfolou o dedão do pé, numa topada “da mulésta” daquelas? Pense numa dor da gota. O jeito era improvisar um curativo nada convencional: lavar o ferimento, botar pó de café e enrolar o desditoso dedão do pé com pedaço de pano. E pedir a Deus que o pai ou mãe não completasse a desdita com um novo curativo, onde seria aplicado álcool e o famigerado mercúrio cromo, que ardia pra danar.

Quer ver outra lembrança nada agradável? Era levar uma mijada de “potó” ou de “papa-pimenta”. Queimava mais que fogo, e no outro dia a grande bolha denunciava a queimadura. Mas doer mesmo era quando a bendita bolha estourava. Interessante é que hoje em dia ninguém fala mais em “Potó” ou “Papa-Pimenta” . Parece que foram extintos pelo “pogréssio”.

Outro inimigo da molecada naqueles tempos de Custódia, era um bezourinho, minúsculo, fedorento, que proliferava nos frondosos “pés-de-figo” espalhados por toda a cidade. Conhecido por “Lacerdinha”, aqueles bichinhos minúsculos causavam profundo ardor, queimava mesmo, quando caíam nos olhos. Também não vejo mais falar deles. Aliás, com a erradicação dos “pés-de-figo” eles ficaram sem o habitat natural.

Já na periferia da cidade, que se resumia a Rua da Remela e adjacências, era a conjuntivite, que não raro atingia praticamente toda a cidade, com o sugestivo nome de “remela”. Sem falar na “papeira”, (Caxumba) que segundo crença, se o menino fizesse esforço ela desceria para os “ documentos” e era morte na certa. O remédio era passar a lama de uma casa de “João-de-barro”, e mugir na porteira de um curral, de manhãzinha. Catapora (varicela) e Bixiga ( Varíola) eram os maiores temores daquela época.

Uma vez por ano Custódia recebia milhares de visitantes que, se por um lado era uma beleza aos olhos, por outro lado era um problema para a cidade. Falo das andorinhas de março. Milhares delas se aglomeravam no telhado da Igreja matriz, e sempre que sino badalava era uma revoada imensa, formando verdadeiras nuvens de aves que saiam e como sempre, despejando seus indesejáveis “presentinhos” na cabeça de quem estava por perto. Recordo que a molecada se vingava de uma maneira muito original, apesar de malvada: faziam pequenos anzóis de alfinetes, pegavam mariposas vivas e colocavam como iscas nesses anzóis, presos por uma fina linha. Quando soltava a mariposa, esta ficava batendo as asas no ar, suspendendo o pequeno anzol. Quando o olhar atento de uma andorinha via a mariposa, dava um vôo rasante e bicava a mariposa e junto a ela o anzol, era fisgada a pobre ave. Malvadeza, mas era a vingança da molecada.

Tudo isso aí era o que de pior existia para a molecada daquele tempo. Pior do que isso? Tinha, sim. Era ter o entusiasmo de ver chegar o Circo de Sêo Alegria na cidade, e na estréia do espetáculo (no verdadeiro sentido da palavra), não ter dinheiro para apreciar as piadas inesquecíveis do Palhaço Biriba ou as magias incríveis do maior ilusionista que já vi até hoje, Sêo Alegria. Era impressionante os números de magia de Sêo Alegria. Creio que ele praticava a hipnose, pois certa vez eu estava sentado em uma “preguiçosa” no oitão da mercearia de meu pai, na Av. Manoel Borba, quando ele, acompanhado da meninada passou por perto de mim. Me olhou fixamente e mostrou uma grande e reluzente moeda, que seria de ouro e perguntou-me se eu a queria. Claro que disse que sim, tendo ele soltado em minha mão a dita cuja. Levantei-me às pressas e fui mostrar a fortuna que havia ganho a minha mãe e…desilusão: estaca com um caco de telha na mão.

Não havia sofrimento maior que ficar do lado de fora do circo, e não poder apreciar aquele mundo, pela ausência de alguns míseros trocados. Ainda bem que tais lembranças raramente nos acomete, as boas lembranças se sobrepõem a essas.

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Doca - Texto: José Soares de Melo

Bastante querido por adultos e crianças, Doca era carinhosamente chamado de Doquinha. Sua deficiência mental em nada atingiu o bom humor, a seriedade, o gosto por aventuras (por vezes sumia, em viagens pelas redondezas) e até pelos prazeres da vida: adorava um cigarro, e se algum irresponsável lhe desse, apreciava uns goles da “marvada”, ocasião em que ficava intolerável.
Diferente da grande maioria dos deficientes mentais, Doca era extremamente querido por todos, inclusive pela família, os Benício. Seu pai, Mestre Ozório, Toinho Benício, Joãozinho Benício, enfim, todos da família, nutriam verdadeiro carinho por Doca, e lhes davam toda assistência possível.

Como característica especial, Doca tinha duas manias: uma delas, era a de posar de policial. Sempre conseguia um chapéu ou uma farda da PM, que usava permanentemente. Contam que certa vez tinha um bêbado abusando nas ruas, tendo os gaiatos o advertido de que o Soldado Doca poderia aparecer a qualquer momento e prender o abusado. E não é que Doca apareceu, e incentivado pela turma deu “voz de prisão” ao bêbado e o conduziu até a Cadeia?

Outra característica de Doca era personificar um Orador. Mesmo sem ser entendido por ninguém, sempre ganhava uns trocados para pronunciar discursos inflamados e cheios de gestos. Quem apenas o escutasse, sem o ver, certamente julgaria ser um discurso em outro idioma, tamanha a ênfase com que ele balbuciava sílabas incompreensíveis.

Certa feita, na década de setenta, eu fazia um programa de auditório aos domingos, no velho Centro Lítero Recreativo. Num desses, a Rádio Pajeú resolveu o transmitir direto de Custódia, o que foi feito com o CLRC lotado. Distribuição de brindes, publicidade e várias atrações locais foram apresentadas. O Sanfoneiro Joãozinho, o Conjunto Musical “Os Ardentes”, sem contar com grande número de calouros, como Gonzaga de Alcides Bom (que cantava música de sua autoria), o Primo Ozório, Zé Esdras, (o ex-Prefeito mesmo!), o Dr. Ferdinando, (também ex-prefeito, de Serra Talhada) na época estudantes. Enfim, muitas “atrações” foram apresentadas. Mas quem fez sucesso mesmo, foi Doquinha, com o mais inflamado de todos os seus discursos. Tanto que posteriormente a Rádio Pajeú recebeu cartas perguntando em que língua aquele orador tinha falado...

Parece-me estar o vendo conversando seriamente, olhos arregalados, contando alguns fatos, cheio de gestos e trejeitos, que não eram compreendidos por ninguém, e ao término sair andando normalmente, acenando com a mão para os que ficavam.

PS. - Doca é membro da família Benício, irmão de João Benício, seu nome de batismo era Diocleciano Benício de Queiroz.

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Cacimba Nova - Texto: José Soares de Melo

O título não tem nada a ver com a excelente música de Zé Marcolino, eternizada na voz do também eterno Luiz Lua Gonzaga. É apenas um rasgo de lembranças de um passado distante, sepultado que foi pelas águas do Açude Marrecas. Cacimba Nova era o sítio em que vivi memoráveis dias de felicidade na minha infância, dias que conseguiram gravar imagens indeléveis daquela paisagem, que começava na Fazenda Guarani, hoje transformada pela invasão urbana da cidade em ruas que compõem o Bairro da Redenção. Quantas vezes não fiz o percurso de nossa casa, nos fundos da mercearia de minha família, na esquina da Avenida Manoel Borba, com a Avenida Onze de Setembro! Cruzava a Rua deserta, cedinho, sob a névoa que dominava as manhãs da cidade, pegava a calçada do velho Grupo Escolar General Joaquim Inácio, e no final do seu muro cruzava o antigo campo de futebol, onde hoje funciona o Posto Tamboril.

A partir daí, um sombreado corredor composto por cercas de avelozes, com a estradinha macia, coberta de uma areia branca, muito fina, levava até a velha casa de meus avós, distante cerca de três quilômetros da cidade. Poucas casas no trajeto. A primeira, de um senhor,cujo nome era algo como Manoel Conceição; a seguir, uma pequena sequência de casebres de taipa, onde moravam a família de “Seu” Porfírio, e de uma senhora já centenária, cujo nome minha memória teima em não lembrar. Depois, já chegando ao Guarani, após uma curva, um pequeno quarto, onde funcionava a Bodega de João de Zumba. Mais a frente, a Fazenda que dava nome ao lugar, Guarani, com seu bangalô moderno, e um imponente Eucalipto ao lado. Agora a estrada já era mais estreita, com a vegetação quase que a recobrindo. Ao final daquele corredor, um velho umbuzeiro era parada obrigatória, quando em safra, para a colheita de umbus. A Casa de Henrique, meu parente, como quase todos que residiam naquelas bandas. Pertinho, o casarão de Tio Anízio Batista, que na verdade era tio de meu pai. Outras casinhas mais adiante, sempre de parentes. Os Raimundo, a “Tia Miné”, Minervina, outra tia do meu pai, a enorme Casa de “Tio Zé Batista”, que anualmente promovia o mais animado São João da região.

Cruzando o Rio da Marreca, logo após um pequeno trajeto, chegava a casa dos meus avós. Velho casarão cujas paredes mais pareciam as de uma igreja: cerca de cinqüenta centímetros de espessura. Porta larga e muitas janelas na frente. Um verdadeiro salão era na verdade a parte mais movimentada da casa: modestamente mobiliada – apenas um imenso e pesado banco de baraúna, algumas cadeiras, uma mesinha com o oratório, alguns quadros com gravuras de santos e fotografias da família e mais nada, além dos indispensáveis “armadores de rede”, feitos em madeira e encravados na largas paredes, servia como sala de visitas, capelas para as novenas, dormitório de redes estendidas quando a família se reunia, área de diversão da criançada quando o sol estava muito forte ou chovia, sem falar nos verdadeiros saraus literários que eram realizados nos finais de semana, com a família reunida para ouvir a leitura obrigatória do mais autêntico meio de propagação da cultura da época, e que era conhecido por “Romance”, como era conhecido o hoje famoso Cordel. Um corredor escuro separava aquele salão da Sala de jantar, e dividia a casa em duas alas com suas “camarinhas”, duas de cada lado, que era como chamavam os quartos. Na sala de jantar, uma comprida e pesada mesa, com duas cadeiras nas testadas e dois bancos nas laterais era o local das várias refeições diárias: o café da manhã, sempre a seis horas, o almoço, as dez horas, a ceia, as quinze horas e o jantar as dezessete horas, além dos lanches das crianças.

Nada me agrava mais do que após as primeiras travessuras do dia, ir para o “Reveso”, como chamavam um pequeno pomar que ficava em frente à casa, as margens do Rio.Colhia Goiaba, manga, banana, Graviola – que conhecíamos como “Coração da Índia”, caju e muitas hortaliças e verduras. No mesmo ficava a cacimba, a fonte de abastecimento da casa, durante o período de seca.

Achava interessante a minha avó preparar o xerém, moendo o milho numa espécie de moenda, composta por duas rodas de pedra, uma sobre a outra. A de cima dispunha de uma espécie de maçaneta e de um buraco, onde eram colocados os grãos. Girando a parte de cima, o atrito entre as duas pedras quebrava o milho, produzindo o xerém.

Da mesma forma era interessante quando minha avó ia “torrar” café. Os graus do café, misturados a pedaços de rapadura em uma panela fumegando espalha o cheiro forte do café por centenas de metros. Depois de torrado, o café se transformava no massa pastosa, extremamente preta, que era espalhada também sobre uma pedra lavrada, em formato de tábua, para esfriar e endurecer. Depois de frio, o café se transformava em uma espécie de pizza preta, que era quebrada e jogados os pedaços no pilão para ser socado até virar aquele pozinho amarronzado e de cheiro forte.

Na cozinha, o velho “Meu Louro”, que não escapava das brincadeiras da meninada. Tio Dué o ensinou a assoviar. Anos depois, não sei como, ele ensinou o papagaio a perguntar, sempre que alguém assoviava:

-“ Foi eu ou foi tu?”

Tio Dué caía na gargalhada, dizendo que o papagaio estava “caducando”.

No cercado que ficava após o curral, as margens de um riacho, um frondoso sombrião, com suas flores vermelhas era o abrigo certo para as brincadeiras da meninada, quando o sol queimava de quente. Algumas fruteiras, como pinha, manga e graviola nos forneciam preciosos frutos.

No terreiro da frente, a velha quixabeira, que abrigava do sol o velho e encardido carro de bois. Deitado nele sonhei muitos sonhos de criança livre, despreocupada e feliz.

Ao entardecer, não sei por que, mas sempre me sentia como que angustiado, naquele momento de paz, de solidão, no lusco-fusco da passagem do dia para a noite. Os pássaros iam encerrando suas sinfonias, o sol esmaecia no poente, os únicos barulhos perceptíveis eram os dos chocalhos que com seu som monótono anunciavam a chegada das vacas leiteiras do pasto, para a separação noturna de seus bezerros, que ficavam, no linguajar do sertanejo, “apartados” para preservar o leite da manhã seguinte.

E a noite assumia o lugar do dia, não raro com a presença mágica da lua, que enfeitava o céu azulado com sua claridade prateada derramando-se pelos terreiros, estradas e roçados. Estrelas brilhantes enfeitavam aquele cenário espetacular, deixando a todos embalados pela brisa fresca que varria os campos e chegava até a calçada do velho casarão, verdadeiro encantamento que me fazia teimar em permanecer até tarde observado aquele cenário.

Velhos tempos, belos dias que teimam em não sair da minha lembrança.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Jornal Custodianas - Texto: José Soares de Melo

Observando o número de órgãos de comunicação hoje existentes na nossa sofrida região, voltei no tempo e me vi em plena década de sessenta, início da de setenta, faminto por informação em busca de leitura de textos que retratassem a nossa realidade. Não me apetecia a leitura dirigida de jornais – raros naquela época, revistas – caras e difíceis de encontrar. E eis que recordei a alegria e satisfação que sentia ao pegar um exemplar surrado, passado de mãos em mãos, do semanal mais divertido e cultural que a minha Custódia já teve: “Custodianas”, criação de uma dupla de jovens e dedicados conterrâneos que, usando pseudônimos interessantes semanalmente mostravam a sua criatividade, cultura humor e compromisso social: Ernani Quintine Jásper, que ocultava o nome do culto Professor, Advogado, Escritor e Acadêmico Dr. Ernesto Queiroz Júnior, e Pierre Pedrosa Sobral, assinatura do meu compadre e amigo Dr. Pedro Pereira Sobrinho, exímio orador, detentor de uma cultura extraordinária, a quem chamo de bi-doutor, por ser advogado e odontólogo. Isso sem contar vários colaboradores, como Silvio Carneiro, cujo pseudônimo o tempo me fez esquecer, sem, no entanto jamais esquecer a figura extraordinária que foi o Professor Sílvio. Inteligente, preparado, comprometido com nossa terra, foi educador, Professor, diretor, e principalmente amigo dos estudantes. Como Prefeito, iniciou uma completa mudança no estilo administrativo de nossa cidade, contemplando aspectos gerenciais ainda não implantados na terrinha.

Mas aqui quero falar mesmo é da satisfação de ver hoje não apenas Custódia, como toda a região, inserida no mundo da comunicação, através de instrumentos os mais diversos, como a internet, com blogs com um conteúdo invejável, como “Custódia, terra querida”, do amigo Paulo Peterson, as emissoras de rádio – duas em Custódia, os periódicos, enfim, toda uma rede de comunicação levando a informação aos quatro cantos do mundo. Graças a essa rede, aspectos históricos, culturais, políticos e sociais antes ignorados são levados ao conhecimento geral.

“Custodianas” representou muito na minha formação. Posso dizer até que foi o “culpado” pelo fato de hoje eu ter o hábito de escrevinhar alguns textos, como pura diversão. Explico: Ao ler aquele semanário, eu me sentia parte daquelas situações, vez que os personagens citados eram todos conhecidos de todos. As piadas eram contadas nomeando pessoas da cidade; os fatos reais eram relatados identificando todos os personagens. Era feito o registro de tudo que ocorria na cidade. Na educação, na sociedade, no comércio, enfim, todas as atividades tinham o registro do jornalzinho “Custodianas”. Depois de cada festa realizada – raras, naquele tempo, a edição seguinte era aguardada com ansiedade por todos. Além do registro do evento, vinham as brincadeiras com membros da sociedade local. Eram noticiados os namoricos, as gafes, enfim era feito uma radiografia completa de cada evento.

Tal gama de informações poderia gerar problemas para os editores, no entanto jamais tomei conhecimento de que alguém ficasse chateado com as brincadeiras ou piadas ali publicadas. Isso porque acima de tudo havia respeito, as brincadeiras eram leves, descontraídas, diferente do que vemos, por exemplo, em murais de sites por aí.

Marcou época o “Custodianas”. Pena que não exista um acervo daquele periódico, para estudo, pesquisa e até para uma melhor compreensão daquela época.

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Nós e Os Violados - Texto de Carlos Lopes

(... Naquela primavera de 1979 os dias eram iguais aos anteriores e muito parecidos aos tantos das outras estações do ano. Além dos ensaios com a banda marcial do Colégio Padre Leão, por conta do 11 de setembro, só nos restava fazer circular um jornal cujo batismo era ¨O Grito¨. Este apesar do bom conteúdo e dos ótimos colaboradores o taxaram de ser ¨meio¨didático).

Texto retirado para compor livro

Carlos Lopes