quarta-feira, 23 de maio de 2012

God save the Euro - Autor: José Cláudio Cacá

Numa reunião entre uns vinte estavam presentes irresponsáveis, aventureiros, descontrolados, sobreviventes e também os desprovidos de recursos. Eles tinham uma única coisa em comum na pauta: eram todos pobres. Cada um dando seu jeito de, primeiramente, justificar a pobreza. Uns transferindo a culpa para os ricos, “aqueles egoístas”. Outros se lamuriando de que não conseguiam vender nada para quem tinha dinheiro, pois sempre queriam pagar menos do que o que seu produto valia. Havia os megalomaníacos, que diziam ser  seu endividamento causado por “aquelas grandes obras”, mas que ainda haveriam de dar um bom retorno algum dia. O objetivo era encontrar uma saída honrosa e em conjunto para a situação, seja ajudando-se uns aos outros, seja traçando metas comuns de agir. Esbarravam sempre nas resistências dos ricos em ajudar com empréstimos ou perdão das dívidas. Não houve nenhum acordo até que apareceu o Sr. Fundão, aquele que dizia ter uma procuração dos mais ricos do mundo para ajudar aos pobres a se manterem de pé. Chegou, olhou aquela bagunça de papeis amassados pelo chão, copinhos que descartavam por todos os lados, muita fumaceira de cigarro e já foi dando logo um aviso. “Primeiro, arrumem a casa, depois eu volto.” Voltou e já com tudo em seus devidos lugares impôs condições duríssimas para  fornecer ajuda. Ela viria em primeiro lugar com consultorias e com determinações rígidas em como gerir os poucos recursos (de preferência fazendo aquela famosa realocação, tirando de um lugar para colocar em outro mais carente). Por exemplo, falou para um homem mal arrumado à beça: você pode, em vez de usar esse terno caríssimo, um mais baratinho e , em compensação, comprar um sapato mais apresentável do que esse. Em vez de ostentar esse relógio de ouro (foi lá no braço conferir se era mesmo um rolex legítimo), pode usar daqueles que vem com um monte de pulseiras coloridas para variar e todos pensarem que é relógio novo. Depois disso tudo, aí, sim, nós emprestamos dinheiro novo ou perdoamos parte dos juros de quem cumprir tudinho à risca. Meio ensaiando alguns protestos, a reunião foi encerrada e o acordo assinado para os próximos seis meses (com acompanhamento quinzenal por uma equipe de metas do Sr Fundão).
Num outro lugar não muito distante, em outra ocasião não muito distante, estavam reunidos uns outros vinte com dificuldades financeiras - que eles preferem chamar de desajustes pontuais. Tinha lá até representante real, reinos unidos, parlamentos inteiros, gente graúda mesmo, dona de mais da metade da riqueza que circula pelo mundo afora. Tinha também irresponsáveis, megalomaníacos, descontrolados e aventureiros. Mas o comum entre eles é que eram todos ricos, muito ricos. Nunguém queria justificar nada, achando que não deviam dar satisfações do que fizeram com seu dinheiro. Sequer admitiam alguns de possuírem dívidas. Veio o Sr. Fundão dar palpite e quase é enxotado da reunião. Onde já se viu vir querer falar para os ricos que deve-se gastar assim e não assado? E ainda por cima, o Sr fundão era o próprio procurador deles mesmo. Quanta petulância!
Resolveriam eles mesmos e a seu modo como sempre foi depois que ficaram ricos. Antes até aceitavam ajuda de um certo Tio Sam. Mas ele agora também estava em sérias dificuldades.
O Fundo Monetário Internacional (FMI, aqui chamado de Sr Fundão) já mandou e desmandou no mundo chamado subdesenvolvido, agindo acintosamente com as economias pequenas e países pobres. Os Estados Unidos sempre controlaram-no junto com os europeus. Os EUA hoje estão “sem bala na agulha” como se diz no jargão das finanças quando alguém está sem dinheiro. Os europeus estão  tentando a todo custa salvar o Euro (sua moeda única). França e Alemanha lideram as tentativas de entendimento sob a resistência da Inglaterra( e todo o Reino Unido). Afinal eles já foram um império mas perderam o trono e  boa parte das jóias da coroa. Não estarei aqui para presenciar o desfecho mas isso não vai terminar bem. Nem EUA nem Europa. Na história os grandes impérios nunca caíram em situação de paz.
Autor: José Cláudio - Cacá - Belo Horizonte/MG
Publicação autorizada através de e-mail de 22/05/2012
Publicada originalmente no blog emquantos.blogspot.com

Um comentário:

Aleatoriamente disse...

Cacá sempre nos presenteia com belezas na alma.Sabe conduzir um texto para a mais profunda reflexão, e também sem nos deixar perder o humor, a alegria de apreciar alregremente.
Seus conteúdos vastos são verdadeiros tesouros literários.Adorei e não poderia ser diferente.

Um beijo ao Cacá e parabéns a você Carlos, por sua escolha.