Autora: Marina Alves
Sexta-feira,
7 da noite. Tenho uma reunião marcada e não posso faltar. Saio apressada pela
rua. Um sentimento esquisito, um receio inexplicável me vem. Não estranho essa
estranha sensação: deve ser a mesma que todo cidadão de bem anda tendo
ultimamente.
Sigo
pensando que a rua está deserta demais para o horário. Não estará muito escura
também? Tanta árvore parece ter diminuído a claridade e a visibilidade para
quem transita pelas calçadas. O perigo pode estar aí, atrás de algum tronco, de
algum canto de muro, de alguma sombra, a espreitar os mais desavisados.
O
fato é que nós, interioranos e, principalmente, os remanescentes de outras
gerações e de tempos mais tranquilos, ainda não acreditamos que as coisas
mudaram e todo cuidado é pouco. Quem gosta de admitir que nossa pacata
cidadezinha, tão boa de viver, não é mais a mesma?
Fico
entre a dúvida e a perplexidade: durante o dia ouvi pelo rádio, notícias que,
mal posso crer, agora são comuns em nosso cotidiano. Por exemplo, hoje, aqui
mesmo onde tenho que passar, numa rua outrora pacífica e sossegada, ocorreu um
assalto à mão armada, às 13h, em plena luz do dia. Não bastasse isso, o
noticiário ainda reforça “só nesse ponto, nessa esquina, este é o terceiro
assalto”... Entre sobressaltos chego à minha reunião. Ufa! Que aventura! Ainda
bem que devo voltar pra casa de carona com uma amiga...
Sábado,
8 da noite. Vou à padaria. As ruas desertas mostram um cenário próprio de um
centro comercial em horário noturno. De repente eu os vejo. São três tipos
esquisitos — eu acho. Penso logo que têm cara de suspeitos. Incrível! Nem sei
quem são, mas cismo que estão olhando demais a vitrina de uma loja. Não evito
um pensamento fatal: estarão tramando alguma coisa? Inofensivos ou não, acabo
por me desviar e apertar o passo...
Segunda-feira,
2 da tarde. Estou de folga em
casa. Alguém chama lá fora querendo mostrar equipamentos de
segurança. Recebo a vendedora com “um pé atrás”. Ela me explica num longo
discurso de “marketing” as vantagens de suas câmeras de circuito interno e a
eficácia de seus alarmes. Faz uma explanação detalhada sobre a importância de
se investir em segurança
Olho
bem a cara da moça. Ela já não me parece tão digna de confiança. Com um
conhecimento, em minha opinião, exagerado, ela descreve os últimos golpes da
praça. E ainda me diz:
―
Você sabe que correu um grande risco ao abrir o portão pra me atender? A coisa
não tá brincadeira!
Mil
pensamentos atravessam de uma vez minha cabeça. Estremeço: e se ELA também for
uma golpista? Por que, não? De repente, os seus produtos, tantos folhetos e
tantas condições facilitadas de pagamento me parecem mais uma farsa para
engabelar pobres vítimas ingênuas. Serei eu esta vítima?
Subitamente,
com uma energia surpreendente me decido: não quero nada, fica pra outra vez,
não tenho dinheiro, estou cheia de dívidas no momento, tenho compromisso com
meus próximos dez meses de salário, e por aí vai... Vale tudo e qualquer coisa
que me livre desta pessoa surgida do nada, que me oferece segurança, mas só
Deus sabe com que intenções! Tudo é sempre tão suspeito! Hoje em dia, nunca se
sabe...
Um comentário:
Obrigada, Carlos. É sempre um prazer publicar aqui em Gandavos- Os Contadores de Histórias, espaço rico em boa Literatura e bons autores. Abraço da Marina.
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