Chegou junho, o mês das festas juninas, das fogueiras, do quentão, das bombinhas e das famosas “quadrilhas” que a gente dançava até quase o amanhecer! ... Como era bom.
Recordo-me saudoso dos meus quatorze anos, imberbe ainda, ensaiando a “quadrilha” no Esporte Clube Renascença, Belô, todo cheio de prosopopéia. O Zezinho, um veterano do clube, exímio dançarino, era quem comandava a turma, ensaiando a dança e ensinando a coreografia aos participantes.
“- Anarrier! ...”, gritava ele, e todo mundo que circulava pelo salão feito um “trenzinho”, moça à frente, rapaz atrás segurando na sua cintura, virava-se rápido e fazia o mesmo movimento no retorno. E o entusiasmo, a alegria contagiava-nos a todos, iluminava as faces da rapaziada, provocava um frenesi em todos os jovens corações. Daí a pouco, de novo o Zezinho:-
“- Caminho da roça! ...”
E nós voltávamos, os pares dançando ao ritmo da linda marchinha executada pelo sanfoneiro (“- Com a filha de João/Antonio ia se casar/Mas Pedro fugiu com a noiva/Na hora de ir pro altar ...”), seguindo por um caminho imaginário que nos levaria até a roça!
Durante os ensaios principiei um namoro tímido com a Rosário, menina gordinha e de grandes olhos negros, que formava par comigo. O clima de festa ajudava, os ensaios ensejavam o colóquio e o namorico rolou tranqüilo. Daí a pouco estávamos preparados para o dia da exibição e a ansiedade nos saía por todos os poros do corpo.
Finalmente, o grande dia, um domingo, 24 de junho, dia de São João! Apresentamo-nos todos caracterizados, vestidos como caipiras, os rapazes de botinas e calças de brim cáqui bem justas, tipo “pega frango”, chapéu de palha, as moças de vestidos rodados, recheados com duas ou três anáguas, o carmim pintado nas bochechas, batom nos seus lábios carnudos, cabelos longos em tranças, uma belezura!
Veio a “quadrilha”, perfeitamente bem comandada pelo Zezinho, o sanfoneiro foi show de bola e a alegria tomou conta de todos, dançarinos e povo na assistência. Antes da dança, houve o tradicional “casamento na roça”, com o padre, a noiva (grávida) e o noivo, magrelo e banguela, intimidado pelo guarda fardado e com a espingarda cutucando o seu lombo (casou na marra), cuja encenação foi hilária e provocou estridentes risadas de todos os presentes.
Terminada a exibição, o povo foi se dispersando, as famílias regressando aos seus lares e eu, com a Rosário, agora mais firme do que nunca, fui acompanhá-la até sua casa junto com algumas amigas e amigos. Todos à frente, eu mais atrás com a menina, rindo muito e trocando afagos.
Sozinhos no portão da sua residência, conversamos mais um pouco, nos acariciamos e rolou o primeiro beijo das nossas vidas! Tão rápido, nervoso, pupilas dilatadas, narinas ofegantes que mal deu pra escutar a “tosse” do pai dela, de propósito, por detrás da janela do quarto, raspando a garganta e chamando lá de dentro:-
“- Maria do Rosário, entra pra casa já! Tá fazendo frio e já é quase madrugada, menina!” ...
Autor: Roberto Rêgo - Belo Horizonte/MG
Publicação autorizada através de e-mail do dia 10/10/2011
2 comentários:
A crônica de Roberto Rêgo ¨Anarrier¨nos remete à infância e a adolescência. E a sua forma de relatar nos leva a reviver os pequenos detalhes das festas juninas. Parabéns Roberto.
Roberto Rego você relembra em Anarrier momentos puros que aconteceu na vida de todos nós. É uma ingenuidade das boas. Seu texto é uma delícia de ler.
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