Essa era uma bricadeira entre meninos da minha cidade, considerada muito
violenta. Consistia num contrato entre dois moleques onde aquele que flagrasse
o outro sem pelo menos uma das mãos no bolso tinha o direito de desferir-lhe um
murro nas costas. Podia ser qualquer bolso, desde que de uma roupa que
estivéssemos usando. E caso a roupa (calção, camisa...) não tivesse um, valia
meter a mão por dentro do calção. A execução era sumaríssima e acompanhada de
um grito: "Mão no bolso!". Geralmente quem sofria mais eram os
iniciantes na brincadeira, pois os mais experientes estavam sempre com uma mão
no bolso, quando não as duas. E ainda assim, quando viam alguém se aproximar,
ato reflexo, punham-se em guarda. Os impasses ocorriam justamente quando a pena
era aplicada no momento em que o infrator colocava o mão no bolso e
instalava-se o conflito: o infrator dizia-se injustiçado e o executante
afirmava legalidade no ato. Quando havia um terceiro moleque, amigo dos dois,
recoriam a ele para julguar a legítimidade. Caso fosse considerado injusto, o
injustiçado tinha o direito de desferir semelhante soco, como forma de reparo.
Obviamente a brincadeira era de total desconhecimento de nossos pais pois
tamanha brutalidade era incompatível com o padrão de amizade que reinava
naqueles idos.
Hoje fico me perguntando: Como não seria melhor o mundo se nossos jovens ainda brincassem de mão-no-bolso e abominassem outras formas de violência...
Hoje fico me perguntando: Como não seria melhor o mundo se nossos jovens ainda brincassem de mão-no-bolso e abominassem outras formas de violência...
Autor: Chagoso – Porto
Velho/RO
Página do autor: http://www.recantodasletras.com.br/autor.php?id=16329
Um comentário:
Chagoso, muito do querem condenar hoje como bullying nas escolas, seguiria essa linha da brincadeira da mão no bolso. Hoje, vivemos num estado tal de vigilância, por causa da cultura do politicamente correto, que rituais de iniciação e passagem como esse narrado por você estão sendo totalmente banidos das relações sociais. É claro que somos contra a violência, mas, guardadas as devidas proporções, brincadeiras como essa são brincadeiras típicas de menino, brincadeiras que envolvem solidariedade e gênero. Gostei demais do seu texto! Abraços!
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