Autor: Nêodo Ambrósio de Castro
Noite de inverno. Estava tão frio que a névoa cobria
quase que totalmente a visão daqueles que se aventuravam andar pelas ruas da
cidade.
Com a gola do paletó levantada, para aliviar o frio que
teimava em penetrar em seu corpo, caminhava, Josemar, pela calçada quando quase
tropeçou em um morador de rua que encolhido se cobria, sem muito sucesso, com
folhas de jornais velhos. Se ele não tivesse quase pisado no indigente, nem o
teria notado pois este se encolhera de tal forma que mais parecia um embrulho.
Não deu muita importância a essa ocorrência, continuando
a sua caminhada. Mas ao atingir o cruzamento da rua, enquanto aguardava o sinal
de trânsito abrir, pensou: Se ele que estava somente transitando por ali estava
sentindo que o frio o incomodava tanto, imaginou como aquele morador de rua
devia estar sentindo. Parou, agora com certa curiosidade, resolveu voltar para
ver o que poderia fazer para amenizar o sofrimento daquele ser. Aproximou-se e
tocou-lhe o corpo, para lhe chamar a atenção. Ficou surpreso, pois este estava
tremendo e ao mesmo tempo seu corpo se apresentava tão quente que chegava a
aquecer as mãos que o tocavam. Perguntou ao homem como estava se sentindo e o
mesmo ao responder quase não se fez entender pois balbuciava qualquer coisa com
a voz trêmula tamanho o frio que devia estar sentindo.
Josemar, ficou assustado e imaginou: Não posso deixar
esse homem aqui, ele certamente morrerá, pois esse calor que emana de seu corpo
só pode ser febre alta e ele não conseguirá sobreviver a essa temperatura
durante a noite.
Tentou levantar o pobre homem, mas este de tanto frio
parece que não reagia e tornando-se mais pesado. Tentou novamente, mas parecia
que o morador de rua já havia perdido a esperança de sobreviver e se entregara
e estava sofrendo tanto que preferia ficar ali até que sua vida abandonasse
aquele corpo em brasas.
Josemar voltou até à esquina e parece que por um
milagre, encontrou um policial que cumpria a sua ronda noturna. Pediu-lhe
ajuda, explicando que logo ali adiante encontrava-se um indigente com febre
alta e precisando de socorro médico. Logo o policial concordou em acompanhá-lo
para comprovar seu relato. Chegando até o homem doente, o guarda constatou que
este precisava ser removido, com urgência para um pronto socorro. Através de
seu rádio, solicitou uma ambulância que socorreu o morador de rua,
encaminhando-o para o pronto atendimento que indicou internamento imediato para
tratar de uma pneumonia.
Após cumprir sua missão, Josemar, agora não mais
sentindo tanto frio, pois ao imaginar-se na pele daquele indigente, tinha a
sensação de estar, confortavelmente, agasalhado, dirigiu-se para a sua casa.
Anos se passaram desde aquela experiência e Josemar
continuava sua rotina: Bem cedo se dirigia para o trabalho è pé, pois residia nas
proximidades e já à noite retornava ao lar, sempre fazendo o mesmo trajeto.
Certo dia, ao retornar para casa, uma surpresa o
aguardava. Um desses indivíduos que rondam as noites em busca de uma vítima
para praticar assaltos o abordou. Não acreditando no que estava acontecendo,
Josemar, movido por um reflexo, fez um gesto que o bandido entendeu como reação
e acabou baleado. Sangrando, caiu, enquanto o agressor evadia-se do local. Um
automóvel que se encontrava parado no sinal, presenciou a cena e seu ocupante
correu em seu socorro. Encostou o carro e com muito esforço conseguiu colocar
Josemar dentro do carro, dirigindo-se para o pronto socorro.
Ao chegar, pediu ajuda e foi atendido pelos enfermeiros
do plantão que colocaram a vítima em uma maca o levaram para o centro
cirúrgico, após um exame para localização do projétil que havia se alojado em
seu abdome. O homem que o havia socorrido permaneceu na sala de espera, e
sempre preocupado buscava notícias. Após o ato cirúrgico Josemar foi
encaminhado para a enfermaria, mas o bom samaritano havia providenciado um
quarto particular para o paciente e este foi devidamente alojado em um bom
quarto de hospital, para recuperar-se. Acordando da anestesia, Josemar viu
aquele homem em pé ao lado do seu leito e perguntou-lhe:
- Quem é você e onde eu estou?
- Calma. Você foi ferido em um assalto e eu o trouxe
para esse hospital. Você foi operado, a bala removida e está fora de perigo.
Pergunta, de novo Josemar:
- Quantas horas são? Parece tarde, minha esposa e
filhos devem estar preocupados com o meu atraso. Será que podia pedir a alguém
que os avisasse?
- Claro! Basta me passar o número do telefone que ligo
imediatamente.
O paciente, agora já quase recuperado, ditou o numero
para o estranho e este fez a ligação e avisou a família que não demorou a
aparecer no hospital.
Josemar contou para sua esposa o que havia acontecido e
esta foi ao encontro do desconhecido para agradecer.
- Muito obrigado, senhor, por ter salvo meu marido. Não
sei como posso agradecer, pois sua atitude o salvou de uma morte certa. O
médico me disse que se demorasse mais algum tempo ele poderia ter morrido por
causa da hemorragia. Mas felizmente o senhor o salvou removendo-o para o
hospital.
O estranho respondeu:
- Eu que tenho que agradecer, pois a alguns anos atrás,
seu marido salvou a minha vida, quando acometido de uma pneumonia e sem um
local apropriado para passar a noite, ardia de febre, deitado em uma calçada.
Ele providenciou socorro para mim e assim pude me recuperar e hoje, graças a
ele, a minha vida mudou e mesmo não sabendo que se tratava dele, naquele mesmo
local em que ele havia me encontrado, o encontrei sendo assaltado e ferido por
um bandido de rua. Dessa forma pude retribuir, embora nunca o desejasse. Seu
marido é um bom homem e certamente voltará para sua família dentro de alguns
dias.
A esposa de Josemar ficou espantada com o relato e
voltou-se para o marido para lhe contar. Este, então, queria agradecer
pessoalmente ao estranho e pediu a esposa que o conduzisse até o quarto, mas
quando ela o procurou no corredor, já não o viu mais. Dirigiu-se, então até à
recepção para pedir informação, quando a recepcionista a informou que o
estranho havia pago todas as despesas pedindo para não ser identificado e não
havia deixado nome nem endereço.
Retornando ao quarto, relatou o acontecido ao marido
que com uma lágrima rolando pela face lhe disse:
- Foi Deus quem colocou esse senhor no meu caminho. Eu
tive a oportunidade de ajudá-lo, para que hoje ele pudesse retribuir. Isso
significa que Deus coloca as pessoas certas em nosso caminho. Cabe a nós, no
entanto, decidir de que maneira elas participarão de nossa vida.
Autor: Nêodo Ambrósio de Castro - Eugenópolis/MG
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Publicação autorizada pelo autor
5 comentários:
Excelente! Às vezes, ao salvarmos alguém, nem sabemos que estamos salvando a nós mesmos.
Qualquer comentário que eu faça será dispensável, pois este belo texto já disse tudo o que precisava ser dito. Bela história, vale a pena ser compartilhada ainda que seja ficção. Abraços letripulistas, até!
Obrigado Ana e Helena. Realmente esta lição temos aprendido no cotidiano. Faça sempre o bem, pois quem o pratica o recebe.
Como reza São Francisco de Assis: "É dando que se recebe..."
Abraços fraternos.
sem palavras ...
Deus coloca as pessoas certas em nosso caminho...sem palavras Neodo.Saudades!!!!
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