domingo, 28 de abril de 2013

Sobre ¨Os últimos¨

Autor: Carlos A  Lopes

Quando li o conto ¨Os últimos¨, de Augusto N. Sampaio Angelim, escritor pernambucano, percebi ter em mãos algo precioso e sem relação de conteúdo, veio-me à mente a peça de teatro ¨A última Estação¨. Em seguida recebi e-mail do autor me atentando para o fato de que o seu texto fora ambientado no lugar de nome Brejo Santo.

O lugarejo faz divisa territorial com minha cidade, razão pela qual, se estou indo visitar meus pais não tenho tempo para percebê-lo; se estou voltando à Olinda, estou apressado demais para presenciar os avanços, quase sempre negativos, ocorridos durante décadas. 

Entretanto, ¨Os últimos¨ provocou uma vontade exacerbada de ver as entranhas do lugar e não tão somente as construções visíveis a quem passa pela BR 232, após Riacho das Almas, também conhecida como Verdejantes.

Imaginava que por detrás das ruínas visíveis, havia edificações recentes e moradores remanescentes. Só encontrei um antigo bueiro e uma prensa de madeira, que insiste em ficar de pé. No mais, a caatinga avançava sobre vestígios de moradias e sonhos de vida.

- Olá, como faço pra falar com alguém mais velho?  Perguntei a um garoto que brincava com bolas de gude. Ele inteligentemente apontou o irmão, dois anos mais velho que ele. Ri da minha própria ignorância. Fui apresentado a Márcia, de trinta e dois anos. Enquanto ouvia suas explicações, ouvi: ¨Ô de casa¨, um chamado vindo do lado. Concluí: ¨Pelo menos umas seis famílias residem aqui¨.

Enquanto Márcia ¨passava¨um café, disse: ¨Aqui é apenas um sítio, cujo proprietário é da mesma família de outros tempos.¨ Sábia Márcia! Segundo ela me disse, há muita curiosidade quanto a aparência do lugar, por parte dos viajantes que às vezes passam por ali. Brejo Santo foi sim, o resultado de uma fazenda próspera no tempo do caroá, planta com um tipo de fibra usada para a produção de cordas e têxtil, que depois perdeu a importância, por conta da febre do agave, também um tipo de fibra mais conhecida como sisal. Somado a isso, Caiçara dos Órfãos, a cidade próxima, privilegiou mais os povoados de Algaroba e Riacho Doce. Além de outros fatores veio a decadência de forma tão cruel, que finalmente pude valorizar mais ainda o texto ¨Os últimos¨, cujo autor é de mente privilegiada e uma das pérolas do ¨Recanto das Letras¨.

Durante décadas Brejo Santo se beneficiou do caroá e da dádiva de um rio correndo em seu entorno. Mais tarde o lugar viveu a sua fase mais próxima do desenvolvimento, na direção de tornar-se um distrito. Lá funcionou um posto de gasolina, vendiam-se veículos, havia cultos em uma bela capela e a criançada tinha onde estudar e ainda havia o funcionamento de uma feira livre semanal, o que deixa a dúvida sobre o que faltou para consumar-se a emancipação política.

Já em Caiçara dos Órfãos, eu soube de uma história curiosa, envolvendo o fundador de Brejo Santo. Como o dinheiro corria solto por lá, Lampião certa vez mandou recado que iria buscar uma parte para si. A resposta veio na ponta da língua e pelo mesmo portador: ¨Aqui ele só vai encontrar com quem brigar¨, disse o senhor do lugar. Recado dado. Tempos depois com a intenção de ir a Ibimirim, o Senhor do caruá encontrou dois jagunços, logo após o rio, vindo em sua procura. Perguntado se ele conhecia o tal fazendeiro, respondeu: ¨Não só o conheço como vou mostrar onde ele mora.¨ Minutos depois aponta: ¨A casa dele é aquela, não vou levá-los até lá, não quero ficar marcado.¨ Deu meia volta e fugiu para Placas e depois rumou ao Recife de onde nunca mais voltou. Então eu lhes pergunto: Será que a derrocada de Brejo Santo começou ali? Se assim foi, então esse é mais um pecado nas costas de Lampião.


Autor: Carlos A Lopes

Olinda/PE

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