sexta-feira, 20 de novembro de 2020

ESCOLA DE MOÇAS

 



Maria Conceição Padilha

Altos muros circundavam os jardins que embelezavam o prédio de aspecto aristocrático onde lia-se na fachada: “Escola de Moças Divina Mãe”. Essa foi a primeira visão que Maria Clara teve ao descer do automóvel em frente ao seu novo endereço.

Sendo ela a terceira filha de uma família abastada, da pequena cidade de Rosa Branca, para satisfazer a vontade dos pais em vê-la habilitada o suficiente, para candidatar-se a um casamento próspero, com algum filho de fazendeiro rico, a jovem é enviada a melhor escola da capital, para prendar-se e assim fazer jus a um belo dote.

Após atravessar o longo corredor, Maria Clara entra em seu novo quarto. Há muito esmero e bom gosto no aposento onde a jovem inicia a desfazer as malas. Lágrimas correm de seus olhos ao lembrar dos pais e das irmãs mais velhas, Maria Lúcia e Maria Izabel, lembra também do casarão onde morava com seus familiares e alguns criados. Tudo tão distante...

A jovem acaricia a última mala, seus pertences íntimos, todos os rascunhos e manuscritos que revelam o seu verdadeiro sonho... escrever.

Socorro Beltrão

Clara abriu a mala cuidadosamente. Com verdadeira adoração, pegou seus manuscritos e os guardou na

primeira gaveta da cômoda, a única com chave, ótimo. Trancou e guardou a chave no bolso da saia. Apanhou a fotografia da família e a colocou bem à vista, em cima do móvel. Não sem antes beijar e acariciar um a um, os rostos sorridentes de seus entes queridos. Antônio, seu pai, Ana sua Mãe, Lu e Bel. Voltou a mala, retirou e arrumou as imagens de Santa Terezinha e da sagrada Família, presente de sua vó Alice. “Você pensa que não vi suas lágrimas? Vi sim vozinha! Mas em breve estarei de volta”.

Assim começa uma nova vida para Clara. Acordar cedo, aula de catecismo, português, literatura, etiqueta, piano, violão, canto, educação para o lar, pintura, bordado, tapeçaria, crochê... Até aula de jardinagem... Mas Clara queria aprender línguas, sonhava em viajar pelo mundo, conhecer novos povos, novas culturas... Sonhava em escrever.

Porém como sempre foi uma filha obediente, seguia as ordens dos pais e gostava de aprender e entender de tudo. Aproveitou bem sua estadia no colégio, como também, a vasta biblioteca. Nas horas vagas ficava à sombra de um lindo flamboyant, caneta e papel na mão, escrevendo um novo conto. O lugar era lindo e lírico, a levava a viajar nas suas histórias.

Cristhian Dias

Quão doce, eram os momentos em que aquela ainda quase menina, sentava-se na grama verde, e sentia o frescor da brisa suave em seu rosto. Aquilo para ela era um agrado que Deus lhe enviava. Benditos, eram os momentos que ela sentada, sobre a árvore, começava a escrever suas histórias.

Clara tivera uma infância e pré-adolescência maravilhosas, desde pequena fora cercada pelos livros, dos mais variados gêneros, tomou gosto pela leitura, quando sua governanta, Serafina, por não saber ler, ficava horas ouvindo-a ler para ela... Depois Serafina foi embora para morar na capital, seguindo seu coração, diziam que ela estava esperando um segundo filho, apesar de Clara não ter conhecido o primeiro que ela deixara com sua mãe ao ir trabalhar com sua família.

Gostava de livros de aventura, sua heroína favorita era a guerreira Joana D’Arc, acreditava, piamente, em todos os relatos de sua famosa história...

Neste dia, Maria Clara escrevia, distraída não percebeu a chegada de alguém, só quando ele tossiu para chamar-lhe a atenção, ela saiu dos seus devaneios, era o Raul, jardineiro da escola, ela lhe sorriu, gostava da companhia do rapaz, começaram a conversar e Clara descobriu, para sua surpresa e alegria que ele era o filho de sua querida Serafina.

Saíram a caminhar, felizes se puseram a correr...

Zélia Borges

Pararam ofegantes, e agora de mãos dadas, o coração de Maria Clara bateu forte, mas a razão falou mais alto. Lembrou-se de seus princípios religiosos e da obediência a seus pais. Saiu correndo e retornou ao casarão. Da janela do seu quarto, viu Raul seguindo seu caminho.

Pássaros vinham do lado oposto.

Abriu a mala e dela retirou um livro de páginas amareladas pelo tempo, presente de sua avó materna, foleou e leu: “As andorinhas viam agora em sentido contrário ou não seriam as mesmas, nós é que éramos os mesmos; ali ficamos somando as nossas ilusões, os nossos temores, começando já a somar as nossas saudades.”

Sua beleza é como uma rosa em botão se abrindo. Sua figura naquela janela é um dos mais belos quadros, que com certeza Van Gogh, Portinari, Da Vince... Gostariam de pintar.

E ali ela chorou.

Maria Conceição Padilha

A vida segue tranquila na grande instituição educacional, onde Maria Clara adentra-se no universo de modos, atividades e posturas que a tornarão a dama esperada pelos seus pais, estando assim a altura de um marido rico ou até um nobre.

O tempo passa, mas não passa em Maria Clara a saudade de um passado não tão longínquo. Vem as lembranças de seus sonhos e desejos distantes, mas não apagados, e junto a eles, ao lado do seu último manuscrito, está o retrato do mulato bonito de olhos verdes, o rapaz pobre que a guerra o chamou. Raul, seu amor secreto. Único homem que roubou seu coração. Chove naquela tarde de outono. O silêncio é grande por todo educandário, até o momento que uma campainha toca e Maria Clara é chamada à sala da direção onde é aguardada pela madre superiora que lhe entrega um telegrama. Ali mesmo em frente a catedrática, a jovem nervosa, trêmula, medrosa, abre a correspondência. As lágrimas que correm pelos seus olhos, não passam despercebidas a religiosa que é obrigada a inquirir: notícias ruins? Ao qual a jovem aos prantos e como se a ler estivesse, responde: “familiar mal, venha depressa.”

Como em um vôo de liberdade a jovem atravessa o longo corredor até seu quarto. Entra e substituindo as lágrimas anteriores, junta-se as lágrimas boas de felicidade quando retornando ao telegrama lê: “Voltei, retorne para mim, Raul”.


AUTORES DA OBRA:

SOCORRO BELTRÃO, CRISTHIAN DIAS, ZÉLIA BORGES E MARIA CONCEIÇÃO PADILHA


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