sábado, 6 de outubro de 2012

Sobre o livro ¨Dedos de prosa¨ - Por: Jussara Burgos

Dizem que um livro é uma casa de ouro. Tive a grata satisfação ser presenteada com o ouro do meu amigo Carlinhos de Zé das máquinas, era assim que Carlos Lopes era conhecido na nossa Custódia. “Dedos de prosa” afloraram doces lembranças, vivas nas gavetas de minha memoria. Senti a mesma sensação quando um monomotor singrava o espaço aéreo de Custódia, era um alvoroço, o povo sai de dentro das casas para olhar o céu, a meninada corria e gritava. As meninas não tinham a mesma liberdade dos meninos de correr até o campo de Pouso, ficávamos sempre na barra da saia de nossas mães sob olhar vigilante das mesmas. Oportunidades como essas de reviver meu universo são valiosas. Vivíamos numa época sem televisão. Lembro-me que o grande acontecimento era assistir filmes nos finais de semanas no cinema do pai de Carlinhos. Havia um trato, o filme só começava depois da missa. O bom cristão tinha que assistir a missa toda semana. Minha mãe católica convicta levava sua prole à igreja depois da missa passávamos correndo na farmácia para nosso pai nos dar o dinheiro dos ingressos e íamos ao cinema com o coração saindo pela boca. Quem chegasse primeiro pegava os melhores assentos. Era emocionante ficar esperando o Leão da Metro Goldwyn Mayer abrir a boca anunciando que a película ia começar. Uma ocasião o padre se estendeu muito na homília e nos avisos. Estávamos ansiosos para irmos ao cinema ver um clássico da sétima arte: Bonanza. Meu irmão Marcelo ficou impaciente, pois não queria perder nenhum pedacinho do filme. Finalmente quando o padre falou: Vão em paz e que o Senhor os acompanhem. Meu irmão gritou em alto e bom tom: AMÉM. Diante daquela insubordinação nossa mãe ficou brava e não deixou que ele fosse ao cinema. Ele foi para casa chorando na maior frustação. Por causa dessa e outras ele se tornou ateu.
Lembro-me do filme polêmico que foi apreendido pelas autoridades. O comentário da cidade no dia seguinte era que após o filme os marmanjos fizeram fila na Rua do Sipitinga, a procura das meretrizes.
Sempre digo que a poesia não existe apenas em versos. Vejo fotos e gravuras que considero poemas visuais. Na hora que vi a capa do livro fiquei encantada com a cena. Gostei de saber que aquela menininha da gravura é minha amiga Das Neves, irmã de Carlinhos. Também gostei de ver a gravura de dona Celeste, aquele sorriso eu conheço bem. Ele me acolhia quando eu ia à casa de dona Celeste estudar com Nevinha. Parabenizo o artista Edmar Sales pelo belo trabalho e a você Carlinhos pela gentileza de compartilhar comigo suas boas prosas, Um abraço da sua irmã sertaneja, Jussara Burgos.

Helena Jussara Pereira Burgos Monteiro - Luziânia/GO



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7 comentários:

Maria Mineira disse...

Tenho muitos livros na cabeceira e vou lendo aos poucos a fim de entender a mensagem do autor. Sou fanática por literatura e sei apreciar o que é bom. Tenho um carinho especial por livros onde o autor narra experiências de vida com sensibilidade, principalmente quando narra momentos inesquecíveis da infância. Em se tratando do livro “Dedos de Prosa”, quando vi a capa já me encantei com a imagem, ela me levou de volta aos meus tempos de menina. Que livro bonito! De conto em conto, Carlos soube guiar o leitor através de suas letras e abriu portas de um tempo que numa ou noutra cena nos sentimos presentes.

Ana Bailune disse...

Olá, Carlos. Estou na metade do livro, e para mim, foi como rever um pouco de minha própria história. Lembrei-me de muitas coisas que aconteceram comigo nos meus tempos de criança, e a leitura é leve e saborosa. Um grande abraço!

Carlos Costa - Manaus/AM disse...

"Dedos de Prosa" deve ser uma gostosa viagem à infância do autor, narrada em contos e crônicas, mas ainda não li. Eu o lerei em breve, assim espero

Patricia disse...

Li o livro do meu tio e o texto de Jussara me fez entender melhor aquela época ou os feitos daquela geração. É evidente que, como diz meu tio, o livro mistura ficção e realidade. O testemunho de Jussara separa a ficção da realidade e nos faz melhor entender essa época singular onde a massificação não existia. Um abraço e parabéns Jussara Burgos.

Fabiana Lopez disse...

Infelizmente não li o livro. Adorei o comentário de Jussara Burgos.

Celêdian Assis disse...

Que lindo e sensível depoimento de Jussara, emocionado e emocionante! Nota-se a emoção fluindo a cada "relembrança" que o livro lhe despertou e como o resgate de momentos comuns tem o condão de comover as pessoas. Isto sim é dos pontos altos da boa literatura, quando o leitor assimila a mensagem do autor e se deixa envolver pela leitura. Dedos de Prosa, assim como A Saga de Um Pedro, são relatos intimistas que convidam a esse envolvimento, pois o autor narra com extrema naturalidade, a simplicidade do cotidiano das pessoas, tornando verossímil o que é ficcional e dando vida ao que é real. Carlos Lopes tem esta característica marcante, o que faz com que a leitura de sua obra seja tão gratificante. Parabéns Jussara pelo belíssimo depoimento.
Um abraço para ambos,
Celêdian

Carlos A. Lopes disse...

Amiga Celêdian, o comentário da amiga Jussara Burgos também me emocionou muito. Celêdian, Jussara (juntamente com outros amigos lá de Custódia) criaram o Grupo de Teatro Os Gandavos e você não tem idéia o quanto foi importante para cultura local. A partir desse grupo recebemos em nossa cidade outras peças de teatro e, anualmente, recebiamos a visita de um ator chamado Nino Honorato. Ele, daquela famosa escola de grandes atores sempre trazia um monólogo inesquecível, basta citar As Mãos de Eurídice e Esta noite choveu prata. Enfim, falar da importância de Jussara Burgos na cultura da nossa cidade é preencher páginas e mais páginas. Um abraço a Jussara e obrigado a você Celêdian que indiretamente já faz parte da cultura da nossa Custódia.