Na maioria das fazendas as aves domésticas vivem soltas pelos
terreiros e pastos à mercê de toda espécie de predadores.
Numa manhã, Mariinha soube pela avó:
—Minha fia, a raposa levô a galinha carijó essa noite...
—Tadinha! Quê qui vai sê dos fiotim dela, heim vovó?
—Nóis vai tê de criá os pintim injeitado, cê ajuda a vó?
—Vô ajudá sim sinhora! É só falá o qui ieu tenho qui fazê...
Mariinha tomou para si os cuidados com a ninhada da carijó e
daí por diante passava os dias quebrando milho, fazendo canjiquinha e cavando
cupins para alimentar os filhos adotivos. À medida que iam crescendo cada ave
já cuidava de sua vida. Apenas um casalzinho não largava a menina. Durante o
dia viviam soltos, à noite dormiam dentro de casa, numa caminha improvisada.
Cresceram... O galo era pintado de várias cores e foi
batizado de Neném, a galinha era ruiva de pescoço pelado e se chamava Fiinha.
Interessante, era quando aparecia uma visita. Mariinha fazia questão de
demonstrar: Chegava à janela e gritava para o terreiro:
— Ô Fiinha! Ô Neném!...Vem cá vê, nos tem visita!
— Ô Fiinha! Ô Neném!...Vem cá vê, nos tem visita!
Às vezes, os dois demoravam. A visita até achava que a menina
estava caçoando. Mas de repente, o galo e a galinha chegavam afobados e iam
parar bem ao pé da dona. Havia um fato curioso: o Neném sempre se
atrasava. Ele chiava o peito e não
conseguia acompanhar a Fiinha
Quando a dona das aves brincava de casinha com as primas era
a maior confusão:
—Ieu num quero brincá de buneca! Ieu quero brincá é com os
fio da Mariinha.
—Ieu num vô imprestá o Neném mais a Fiinha procêis não! Meus fiote num gosta de ficá no colo de gente istranha.
—Ieu num vô imprestá o Neném mais a Fiinha procêis não! Meus fiote num gosta de ficá no colo de gente istranha.
A avó tentava contornar a situação. Pegava outras frangas
para que as meninas brincassem, mas estas não paravam quietas e nem dormiam nas
caminhas enroladas em panos, feito o Neném e a Fiinha.
Preocupado o avô avisava:
—Ô Mariinha, minha neta, ocê tá criano munto amor nesses
bicho, quero ti avisá uma coisa: Esses dois se acustumaro assim, inté acha qui
é gente, ês vevi dendicasa, mas é bicho e num vai vivê pra sempre, num quero vê
ocê triste... Tem as raposa, os lobo, os gavião...
Amedrontada, Mariinha não queria mais deixar os “filhos” com
as outras galinhas. Quando os soltava, ia junto vigiando. Por muitas vezes
aconteceu de estar fazendo as refeições quando ao ouvia um gavião. Entrava em
pânico, saía correndo a chamar pelos dois animaizinhos adorados. Se não
apareciam logo, chorava muito e só parava quando o avó ia junto a procurar os
fujões. saiam sempre gritando:
—Fiinhaaa... Nenénnin... Cadê ocêis?
E era uma alegria na família quando encontravam. Afinal, era
impossível não gostar de duas criaturas tão dóceis quando aquelas.
Uma tarde de inverno, não atenderam ao chamado... Ansiosa,
Mariinha custou esperar o avô chegar da roça. Seguiram pelos caminhos de
sempre, passaram perto do corguinho, procuraram no pasto dos bezerros, atrás do
bambuzal. O sol já se escondia atrás da serra. Em prantos, Mariinha chamava-os
pelo nome e nenhum sinal deles.
O avô que havia se distanciado voltou cabisbaixo.
—Bamu simbora minha fia, amanhã nóis acha os dois fujão. Ês
deve de tá impulerado numa arvinha quarqué.
—Não vovô! A Fiinha mais o Neném num pode drumi no mato não,
os dois tão acustumado a drumi dendicasa. ês vai ficá doente com o sereno...
Ao ouvir um barulho conhecido, Mariinha ignorou o chamado de
seu avô. Correu em direção à mangueira e com o coração apertado, viu no chão
algumas penas pintadas e outras ruivas. Olhou para o céu que escurecia e viu
desaparecer lá longe um bando de gaviões...
3 comentários:
Como não se emocionar diante de amor tão puro e dedicado? Neném e Fiinha cabem direitinho no coraçãozinho de qualquer criança que tem amor pra dar e vender. O autor, ou autora, numa brincadeira muito gostosa com as palavras nos deu mostra de que os animais e o homem vivem grandes e fieis amizades. Parabéns ao dono ou dona destas letras. Marina Alves.
(Padrão usado em todos os textos comentados para dar a todos um tratamento igual). Fazendo pois uso dos critérios apontados no regulamento, deixo aqui minha impressão: ortografia, gramática e pontuação mostram que o autor ou a autora domina os mecanismos da língua escrita (incluindo o vernáculo), porém identifiquei um ou outro ponto que pede revisão, apenas detalhes que não interferiram em nada na compreensão. Um relato simples, convincente e recheado de carinho, uma leitura agradável que envolve o leitor. Parece que está totalmente de acordo com a proposta do concurso (observando o requisito de demonstração de afeto pelo animal). Avaliação pessoal: entre bom e muito bom. Parabéns à autora ou ao autor e boa sorte! (Torquato Moreno)
Texto muito bom. O regionalismo da linguagem empresta veracidade à historia, perfeitamente dentro dos parâmetros do concurso. Parabéns a quem produziu o texto.
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