quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Saudades de ontem - Autor: Carlos Costa

Porque hoje é sábado, todos se reúnem na casa de alguém para, perguntando um a um e interrogando os que passam descobrir na casa de quem será a festa, logo mais à noite. Hoje está definido, a festa não será na minha casa, mas na casa do João, que namorou minha irmã mais não namora mais, mas que tem uma irmã bonita que eu já namorou todos os meninos da rua. É fácil saber onde fica a casa do João.

Definido o local, a notícia corre rápido e até de bairros distantes aparece gente. Da sala principal da casa, foram afastados todos os móveis, que eram poucos, e transportados alguns para o terraço e outros para o quarto. Estava pronto o local da festa para receber os convidados.

O dono, como é lógico, ficou à porta, recebendo os que eram convidados e os que se convidaram porque conheciam alguém, que conhecia outro alguém, que era amigo de um amigo do dono da casa. Ao final, todos entravam, brincavam, dançavam, namoravam e terminavam se conhecendo mesmo.

Eu, tímido, ficava só olhando e ouvindo as músicas de Pepino de Capri, Y Santo California, Gilbert, Nazareth, Michael Jacksson, com seus 10 anos de menino prodígio cantando “Beem”e tantos outros sucessos bons que hoje não se escuta mais. A irmã do João, a única pessoa que interessava praticamente a todos os que lá estavam, dançava com outro e eu não tinha coragem de me chegar.

E a festa entrava noite à dentro, cada vez chegando mais gente. Em frente à casa, muitos jovens olhavam para dentro para ver se havia muitas garotas. Festa sem garotas não era festa. Também tentavam descobrir onde seria a festa da semana seguinte, na casa de quem, e se haveria muitas meninas.

O João, dono de tudo, deixou dar onze horas e parou o som da vitrola Nivico. Ninguém entendeu nada. De repente, entrou na sua a sua mãe, dizendo que estava na hora. Na hora de quê, de terminar a festa? Foi o que todos se perguntaram ao mesmo tempo. Não, não era de terminar a festa, mas de cantar parabéns, afinal, havia um aniversariante na festa e era o próprio João.

O estranho é que ninguém sabia que ele estava aniversariando. Todos pensavam que aquela era mais uma simples brincadeira de final de semana, como era comum entre todos os jovens. Muitos esboçaram um sorriso e cantaram parabéns a você. Outros se encostaram pelos cantos, confidenciando alguma coisa nos ouvidos das garotas. Eu fiquei parado, esperando um tempo para me chegar à irmã do João. Veio parabéns e todos cantaram, recomeçando a festa em seguida, que só terminou depois das duas da manhã, um horário considerado já muito tarde para todos os jovens daquela época.

Terminada a festa, desci a rua acompanhado de um grupo de rapazes, ouvindo atentamente o falatório das conquistas. O que menos falava, dizia que havia tocado nas mãos de uma garota. Outros iam mais além e apostavam que tinham beijado fulana, irmã de outra fulana, que namorava com fulano. Já outro havia descoberto que uma garota não namorava mais com aquele rapaz e por aí afora.

Eu, calado, só pensava mesmo no dia em que eu poderia me chegar à irmã do João, que namorava minha irmã. Sabia que, em primeiro lugar, eu teria que aprender a dançar, coisa que eu considerava muito difícil. Mas, afora isso, a festa tinha sido ótima, afinal, eu pude ver, mesmo de longe, a irmã do João!


Crônica extraída de meu livro CRÔNICAS COMPROMETIDAS COM A TUA VIDA, publicado em 1989 e republicado no Estado do Pará em 1990:
Autor: Carlos Costa - Manaus/AM
Blog do autor: http://carloscostajornalismo.blogspot.com/

Publicação autorizada através de e-mail de 25/02/2012

Um comentário:

Carlos A. Lopes disse...

Então amigo Carlos Costa, na minha cidade este tipo de reunião de jovens se chamava ¨Assustado¨. O ¨Assustado¨ consistia em um grupo de jovens se deslocarem até a residência de um amigo ou amiga cujo objetivo era uma festa sem aviso. Pra o dono da casa não ter desculpas, normalmente se levava a vitrola (portátil) e os discos. Não havia como recusar. Ou seja, ¨Que tal fazer um assustado na casa de Carlos Costa, lá em Manaus? Nesse caso não vou, é muito longe!