Singravam as águas do Rio Solimões vindos do Estado
do Pará, um dia um e outro dia o outro, os navios Augusto Montenegro e Lauro
Sodré, mas sempre passavam na madrugada, na comunidade de Varre-Vento. Nunca os
avistávamos navegando juntos! Mas iluminavam tanto que passamos a chamá-los de
“cidades flutuantes” porque clareava toda nossa casa de madeira coberta de
zinco e palha.
Ah, que saudades tenho das duas “cidades
flutuantes”, que causavam alegrias e que desespero quando avistadas ao longe!
De tanto meu pai, acordar, na madrugada, para
colocar a canoa a salvo das fortes ondas produzidas pelos dois navios, decidiu
puxá-la para a terra todas as vezes que precisávamos usá-la, por pura
necessidade, para deslocamentos alguém da família à remo pelos rios. Assim, de
madrugada, em torno de 3 horas da manhã, deixamos de acordar para puxar a
canoa. Era apenas para apreciar o suave deslizar dos navios embicando água para
os lados, produzindo fortes, terríveis e desesperadores banzeiros, que muitos
caboclos aproveitavam para “pegar ondas” em pequenas canoas indo para cima e
para baixo, como se fosse um balé sem música!
Ah, como eram deliciosas e preocupantes a passagem
dos dois navios da Enasa, lindos, grandes, maravilhosos e bastante iluminados.
Na mente da criançada de Varre-Vento, que nunca tinha visto tantas luzes juntas
em um mesmo local, eram apenas duas “cidades flutuantes andantes”, transportando
pessoas com sonhos, alegrias e tristezas.
Como seriam possíveis tantas lâmpadas, dentro das
“cidades flutuantes” de nossas imaginações, navegando suavemente pelo Rio
Solimões? Nunca tínhamos visto nada daquilo e ficávamos imaginando “como será
que conseguem andar as lâmpadas, acompanhando os navios?” “Ou não acompanhavam?
“Estavam dentro dos navios?”
Eram perguntas que só comecei a entender as
respostas depois que meu pai, anos depois, colocou luz elétrica em nossa casa,
ocasião em que fiquei gostosos momentos acendendo e apagando uma lâmpada
incandescente presa em um fio branco pendurado na sala, terminando em uma chave
redonda branca com o plug que fazia “tec” quando acendia e “tec” quando
apagava. Fiquei brincando admirado, acendendo para ouvir o “tic-tac” e observar
o filamento da lâmpada transparente acendendo e apagando.
Será que Thomas Alva Edison, inventor de 2.332
patentes,também chamado de “O Feiticeiro” ou Menlo Park” sentiu a mesma emoção
que tive, quando acendeu o filamento de sua primeira lâmpada elétrica, pela
primeira vez?
- Para com isso, meu filho? Você parece um bobo
acendendo e apagando essa lâmpada!! Era meu pai, me chamando à atenção porque
eu acendia e apagava a lâmpada, sempre olhando para o rumo a lâmpada, ouvindo o
gostoso som aos meus ouvidos do “tic-tac”; tudo só para ver o filamento
clareando e depois escurecendo o ambiente.
Não. Não estava bobo! Só queria mesmo saber como os
navios Augusto Montenegro e Lauro Sodré conseguiam navegar pelo Rio Solimões
com tantas luzes acesas? Será que tinha uma chave única para ligar todas as
luzes ao mesmo tempo?
Mas nunca saberei a resposta às perguntas, pois
minha família não tinha dinheiro para comprar passagem nas “cidades flutuantes”
de minha imaginação e eles também não paravam em Varre-Vento. Depois de ter
nascido no Morro da Liberdade, retornei para Manaus para estudar, em 1969, em
motor regional, todo em madeira! Mas as luzes não me pareciam iguais aos das
“cidades flutuantes” de minha imaginação infantil!
Autor: Carlos Costa - Manaus/AM
Blog do autor: http://carloscostajornalismo.blogspot.com/
Publicação autorizada pelo autor através de e-mail de 15/05/2012
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